quarta-feira, 25 de março de 2009

Não quero choro nem vela

Quero a saída
Quero a voz dela
Quero a mia vida
Quero-a sem ela

Quero

Não quero




Espero.

segunda-feira, 23 de março de 2009

Reef

A barge floating on and on
An endless stream
Perchance a dream

Some sychamores passing by
The azure, cloudless sky
Sights of passing days of yore
The glory of a life that's full

In a majestic past
No head downcast
Men and women on the shore
Bathing in the body of knowledge
Maidens' hearts forbidden to be sore

Humankind felt it needed more
Plus to know
For them to grow...
The focus on the soul

A civilization we don't possess
As we seem to continuously digress
Under nutheads in power - psycopaths
And individuals licking their feet

Kowtowing to Armageddon
And the End of it All
Purchasing their American Dream
In a neaty cosy Mall
All the while feeling
Desperately
Shrunken small

To hell with powwows!

Can't you feel it inside?
Can't help but wonder,
Why am I such a good sheep?
Every waking hour spent asleep.

Nay, not a nice game to play
Anyway, I've got my fair share -
Trying to fix up the world
While forgetting 'bout me self
Thrown up, useless words
Dusty book on the shelf...

Gilead? Where is it, tell me.
Lenore? My maiden braids?
Raven, raven...
What am I supposed to think?

That I'm flying up to heaven?
Meeting Santa Claus along the way...
Paying all my sins for the brief, wondrous display?

I'd rather drop my soul at the sea -
Where no one would have to see
It sinking further and further
A sailor to find it some way:
"Hey, comrades, call it a day!"
I've found it! Gilead's Bay!

Just a place, 'n an instance, to remember
The last living Human ember:
Hope.

That's why we grope in the dark:
For so-called answers.
We'll not give it up,
No matter what they say
We'll not sink, we won't faint
We will never sway.

A crystalline moment it'll be
The one human eyes are meant to see
And take part, if they take heed
After changing themselves
After casting the seed

With its room to grow
Oh! Chase the soul...

domingo, 22 de março de 2009

Intuindo Maus


História gráfica de Art Spiegelman, Maus figura entre meus favoritos, ao lado de Persépolis (Marjane Satrapi), V de Vingança (Alan Moore) e Berserk (Kentaro Miura).

A leitura de Maus é enriquecida e ampliada com A Lista de Schindler (Thomas Keneally) e A Escolha de Sophie (William Styron) - ambos livros aclamados, que posteriormente se tornaram filmes, estes talvez mais divulgados que os próprios livros. Isto me entristece. Parece-me que as pessoas leem menos, e creem que uma obra cinematográfica possa substituir o original. Não inferiorizo a qualidade do que é produzido para as telas, mas a questão não é essa. A questão é o caráter único de se conhecer uma obra, tal qual ela foi concebida por ser autor.

Pelo maior grau de autenticidade que um filme possa reter, volta-se sempre ao original. O original dá ensejo a mais reflexões, a mais críticas, a uma maior assimilação de conteúdo. A uma bagagem cultural maior, portanto. Tendo-se lido o original, pode-se fundamentar uma discussão frutuosa e abrangente, com um potencial ainda maior que sua adaptação possibilitaria. Entre as sagas injustiçadas pelas telas, faço questão de citar Senhor dos Anéis, cuja temática é sobretudo humana e retentor de um vocabulário impressionante da língua inglesa.

Volvendo a Maus. Maus alcança em partes o que um livro escrito jamais alcançaria: a nuância, a sutileza, o perfilar da cena e suas paricularidades. E Art Spiegelman dá-nos a oportunidade de co-participar do plano de fundo de sua criação - a dificultosa relação com o pai, traumatizado pelas experiências de que foi vítima, a dúbia cobertura midiática de uma obra tão provocante e instigante.

Maus dá-nos a sensação de que estamos ali, vendo (literalmente, neste caso) os pormenores das fugas, das incríveis escapatórias de seu pai e de poucos afortunados membros de sua - antes - extensa família. Como ele burlou certas leis com as próprias posses, como se abrigou, como amou em tempos de guerra. Os frutos da amarga separação entre ele e sua esposa nos tempos áureos de seu relacionamento - sem contar a perda do filho primogênito, que crescera sob tantos cuidados e carinho, nutrido de uma cultura ortodoxo que o próprio Art Spiegelman não gozou.

Art Spiegelman produz essa mágica que nos faz acreditar que um detalhe sequer não nos foge à vista e à compreensão imediata. É tudo lançado às claras e vem direto ao lume - da publicação, da divulgação de uma hecatombe planejada. Agora, todas essas sementes germinam no solo do testemunho vivo e excitante do pai. Puxa, ele viveu aquilo, não deve ter sido fácil! De modo algum! É isto que somos levados a pensar e remorder. Maus alcança o patamar da epopéia do povo judeu sob os muros da opressão, remetidos aos guetos do esquecimento, ao apartheid criminoso e racista.

Era hora, aliás, de algum talentoso sul-africano trazer à tona a saga de sobrevivência, luta e morte dos negros submetidos à segregação por um período de quase cinquenta anos (1948-1994). Nem preciso aludir aos nossos compatriotas sem terra (pura ironia), os palestinos (1948- ). Algumas obras têm essa missão, se é que se pode chamar assim o produto de sua divulgação: escancaram os férreos portões da realidade omitida, tergiversada, titubeada, quase apagada. Mas a memória persiste, parece nos dizer. A memória persiste, e o ser humano resiste. Mas quanto tempo durará tão tênue resistência?

A que resiste, pergunta-me.

Respondo-lhe de foma diferente: o ser humano é vítima de si mesmo. Suas próprias decisões o podem levar ora ao precipício, ora à sabedoria. O conhecimento que obtém pode salvá-lo, mas a ignorância é prazerosa. Enquanto persistir o prazer, é dominado pela consumidora e auto-destrutiva ignorância. E enquanto for ignorante, cego, volta-se ao prazer infecundo. Gira, gira, tal o mundo, rumo o abate final.

Desesperançado?

Não. Reconfortante é a busca - a estagnação nos mata. Pouco a pouco deixa rouco. Pouco a pouco deixa mouco. pouco a pouco. deixa louco.

Rota, rota, ser humano
Tua alma há de guiar
Rota rota,
Inspira fundo. Vá!

P.S.: Aliás, para você que não quer comprar o Maus - e pode lê-lo em inglês - use a liberdade e a dica (foi o que fiz):

Maus - 1ª parte

Maus - 2ª parte


Bon chance!

Caged Fasting

You are a brute!
That's my way, darling...
You despise me!
Just as you love me...

Can't you see?
Oh, I can...
Tell me you love me
You tell me first...

You are a blind man!
Just about to burst...
A nutcase, downright fool!
Irremediably in love with you...

Will you please let me go?
I'm not holding you, dear...
Can't you accept a single "no"?!
You're the one coming near...

(falls on his arms, murmuring:)
Oh, you're crazy, but I love you all the same
(he retorts, uncanny eyes 'n voice:)
Beware, sweetheart, falling prey for love's game
(she responds, upstarted:)
Which, do you say, is Love's true Name?
(his terse, curt answer:)
The Mask
The Task
No one attains
The Unerring Arrow
The Uncertain Aim
...
(But I love you, just the same.)

Pender Peneder

Pedro sentou no seixo
Pedro comeu a jaca
Sáxea vazão de dormir
E cair no vazio
Não sentir frio
Jamais sofrer dor

Fluir pelas curvas do rio
Aprender direito o qu'é amor...
Cavaleiros em jesta
Ou nobres em festa

Nunca, nesta floresta
Poderei ter mi'a sesta
Tudo cheira a dor
À morte drástica
Ao ímpio amor
E sua lástima

Queimem incensos
Mas não queimem a mim
Quis eu: não fosse assim
Qual flor, qual jasmim
Tais mares imensos
Ond'eu pudesse mergulhar

Olvidando tuas carícias
Tua boca, teus ouvidos
Todos gestos entretidos
E o rochedo do meu ser
Deixa-me morrer!

Triste, rijo, empedernido
Tal penedo combalido
Porq'eu vivo

(E perduro.)

sexta-feira, 20 de março de 2009

Serpico (Sidney Lumet, 1973)


Belíssima atuação de Al Pacino, no papel de Serpico. Serpico, o policial que quer seguir o juramento, e manter-se honesto, sem auxílio de propinas... decisão difícil, pois todos seus companheiros aceitam-nas de bom grado, e ainda não haviam conhecido qualquer tira novo no pedação que não as aceitasse. Nem haviam topado com um tira barbudo, com brinco, estilo juventude contestadora, sempre usando roupas à paisana que o colocariam facilmente lado a lado a dançadores de Hip Hop.

Será que as roupas que Serpico veste revelam um pouco de quem ele é? Bem capaz, viu. Antes de ele ficar quase insano com as humilhações sofridas por ser um cara direito numa corporação corrupta até as entranhas, Serpico é a imagem do "bom homem". Suas namoradas (uma por vez, óbvio) o adoram, e torna-se amigo de todos os amigos delas também. É a encarnação do "sangue bom", "gente boa", "cara firmeza". Onde quer que esteja, dá seu máximo pra cumprir suas obrigações, sem jamais abusar do poder. Em uma cena, deixa a platéia inclusive estarrecida com o modo pelo qual consegue que um preso confesse: nada de sangue, algemas e gritos. Que tal um cafezinho quente, desalgemado e sendo tratado como um ser humano digno do nome? É. Percebi que o procedimento padrão não faz ninguém feliz na história.

E que é preciso chegar uns bons malucos no pedaço, com um pouco de princípio regrando sua conduta. Por isso, Serpico tem esse dom de mostrar como os "companheiros" de trabalho afastam-se gradualmente do estranho, tentando ajuntar provas e incriminações contra ele no processo. Porque um cara que faça tudo direito e "limpo" acaba arremessando os demais macacos sabujos literalmente na sombra. Filme que mostra que você é quem deseja ser, aspira ser e sonha ser. Nada de seguir com os outros, maria-vai-com-as-outras. Faça como bem entender, porque você é o único cuja confiança é merecida. Os outros? Quem são os outros? Os corruptos, os corruptíveis, os que amam um lucro fácil e por debaixo dos panos?

Nah. Ser diferente requer agir diferente. Agir diferente requer valentia. E quão caro pode lhe custar seguir o próprio coração? Bem, certas escolhas são incomensuráveis... e é preciso ter um objetivo muito bem firmado para seguir com elas adiante.

domingo, 15 de março de 2009

The Kautokeino Rebellion (A Rebelião de Kautokeino, 2008)


Senti-me tentado a escrever um pouco sobre este maravilhoso filme. Isso porque ao escrever a resenha de Far North (2007), rememorei ter assistido a outro também brilhante filme norueguês. Por retratar um evento histórico de expressiva repercussão na Noruega, increve-se, pois, no círculo de filmes baseados em histórias reais. Porém põe-se um pouco acima da maioria, visto que não é meramente um relato de dimensões individuais, mas uma insubordinação de todo um povo, habitante do município de Kautokeino, no território norueguês.

Kautokeino é a pronúncia norueguesa do termo sâmi Guovdageaidnu. Sâmi é a língua oficial de dois condados (divisões administrativas) e seis municípios da Noruega. O filme, portanto, é todo falado em Sâmi, o que oferece uma oportunidade de adentrar uma realidade fonética bastante singular. Apenas pela particularidade do idioma falado, não poderia dizer que é um grande filme, pois o é. Tenhamos, daí, uma melhor idéia do que consistiu a Rebelião de Kautokeino.

A comunidade sâmi do município de Kautokeino era praticamente coagida a adquirir todos seus produtos alimentícios de uma única mercearia; monopolizadores e sacanas, seus donos forneciam também bebidas alcoólicas, fazendo com que vários homens e suas respectivas famílias se endividassem e tivessem parte de seus rebanhos de renas (seu meio de subsistência) ceifados, em um quitamento de dívidas extremamente desigual.

Um morador, que tinha contato com o mercado distribuidor mais próximo, inteligentemente buscou a solução: contatar o padre da cidade para que solucionasse o problema do alcoolismo entre os homens da comunidade, que viraram presas fáceis e perdiam dezenas de renas periodicamente; e comprar diretamente do mercado, redistribuindo a preço de custo os produtos para a pequena comunidade, num projeto pragmaticamente socialista, por mais que seu feitor o ignorasse. E deu certo. Funcionou como ele imaginava.

Entretanto, os donos da mercearia levaram aquilo como um ataque pessoal, e fizeram de tudo, incluindo de prisões de moradores da comunidade a sérias ameaças a seu modo de vida, para obrigá-los a largarem sua religião (para que os homens voltassem a beber e se endividar e conseqüentemente perder seus valiosos rebanhos de renas), e para voltar ao velho e lucrativo monopólio. Foi um embargo criminoso, um embargo de ordem econômica, religiosa e social (aos seus modos tradicionais de vida).

Os moradores bravamente ergueram os braços, uniram-se e mataram os responsáveis por tamanho sofrimento. Com as próprias mãos, eles se livraram do mal, e disseram amém.

Mas as consequências haveriam de vir...

Um lindo filme, um justo tema, e uma belíssima atriz protagonizando a luta de um povo, e d'uma geração. Amaldiçoada pela inação e subsequente conivência do Estado.

Um Estado que obviamente não é para todos, mas, sim, para uma minoria rica, exploradora e pouco se importando com a desigualdade que promove por meio de sua ânsia injustificável por riquezas e mais riquezas.

Logo, um filme que incita a reflexão sobre o que é justiça, e o que nós podemos fazer.

Curse us, If we don't
Curse us, If we won't
We'll destroy iniquity
Affirming our community

We'll see what we can do
And will act upon what we daily see
The seeds of injustice and inequality

We'll pay in advance
And nothing will stop us
Not your supercillious glance
They can kill us
But they'll go first.

Informações a mais sobre a Rebelião de Kautokeino (em inglês): clique aqui.

Far North (2007)


Anja e Saiva, duas esquimós vivendo à margem da civilização, na Tundra Ártica russa. Pouco a pouco nós é contada a história de Saiva e de Anja, e o que justifica o fato de ambas viverem isoladas do mundo, em um local inóspito, e sem alma humana alguma - além delas mesmas. A atuação não decepciona, muito menos a fotografia, embasbacante. Aurora boreal, filmada. O branco níveo, estendo-se ao horizonte, em meio ao... nada. Gelo, branco, gelo, branco... e o horizonte, branco, gelo.

Loki entra na história. Deus nórdico, que mudava de forma. Mas, desta vez, plenamente humano, e arricando insinuar-se num universo até então ordeiro, partilhado por mãe e filha, numa relação harmoniosa.

Bem, há criticismos rolando por aqui e ali sobre o filme, então serei sincero: não sei se foi meu estado de espírito que permitiu ver na tela não só uma obra cinegráfica, mas como, também, um tecer intrincado de relações entre mãe, filha e o estrangeiro, com flashbacks oportunos e impactantes. E, quiçá, meu elevado estado de espírito, (rio com isso), tenha me permitido apreciar o filme em sua fotografia belíssima, em seu entrelaçamento humano, na apresentação dos conflitos que irrompem, e de uma possível personagem neurótica.

Nada é morto, apesar do frio, da distância, e da eternidade representada em tantas nuâncias de um mesmo branco. A vida, vívida, em oposição à morte, ao Tânatos, e à supressão do impulso vivificante. A resistência humana frente ao infinito paisagístico. Os embates psicológicos que decorrem e como eles podem ser solucionados onde o sol não se faz sentir.

E, sobretudo, meu respeito aos prenúncios e vaticínios dos xamãs. O filme, hermético, fecha-se no agouro inicial.

Por isso só é belo.

Curiosity killed the cat... Satisfaction brought him back...

Sleepless night
Frightening dreams
Waking Up to find
Nothing is as it seems

Life is a battle
Continuous rattle
Dust and heat.

Neat... only our heart.
Wanna go back to the start?

Ha, not even being smart
Myself
Would I take that ole book
Off the shelf.

A Marca da Maldade (Orson Welles, 1958)


Um filme delineado pela ação e pelos planos de sequência. Necessita de muita atenção do espectador aos diálogos, que se dão de maneira rápida e sempre envolvendo um raciocínio lógico. Para quem gosta de Sherlock Holmes, é um filme que não decepciona em ponto algum. Ora intrigante nas questões levantadas, ora envolto em uma trama de puro suspense, dá o que ver, e muito mais o que pensar.

Se fosse mais um filme de detetives cliché, blasé, não haveria porque falar dele. E é exatamente por transcender as pistas fáceis e a atitude policial supostamente limpa, que ele tem algo a nos contar. Mais que um causo, ou uma simples anedota do gênero, ele escancara um vilão arguto e do lado da lei. E ao revelar a verdadeira identidade desse criminoso sob trajes de ovelha e com um background psicológico devastado após a morte da esposa, apresenta-nos uma realidade tênue, e deveras escorregadia.

Para que serve a vingança, se seu fundamento é o ódio e o ressentimento extravasado? Ressentir-se é uma forma de (re-)aprender. Porém, uma vez que toda a angústia se externaliza para o outro, já não é de forma alguma um processo catártico, mas algo cíclico. Violência leva à violência, e o que mata à espada, à ela sucumbirá. Karma é o nome.

Vargas, o tira ideal. O que não se corrompe é logo de cara ameaçado pelos corruptos, por meio de subterfúgios ou nem. O fato de se destoar dos demais, faz com que sua postura ganhe maior visibilidade pelas outras partes. Tal visibilidade não é bem-aceita por aqueles que terão sua má conduta em breve identificada, uma vez que surgiu naquele antro alguém cujo trabalho limpo e correto serve de parâmetro universal.

Fabricar evidências é como contar mentiras: mede-se o passo em perna curta. Se ninguém for calado a tempo, não dura muito até que o mentiroso seja devidamente descoberto. Mas há sempre percalços, como seria de se esperar. Há sempre uma armação por debaixo dos panos, com tenção de sujar o nome e renome do tira escorreito. O bem que ele perpetua não conta, quando a corrupção vira regra, e a conduta direita, a exceção.

Quem se importa, não é mesmo?

Desviar as regras, para servir nossos propósitos.

Eis o mundo do caos. Dos cacos.

Humanos quebrantáveis... e o mundo girando.

sábado, 14 de março de 2009

O Sol Enganador (1994)


(quer uma dica? Só vou dá-la se você segui-la - estou de olho. Clique no vídeo desta postagem, para escutar a bela trilha sonora enquanto lês este breve escrevinhar cá feito. Sem preocupar-se - a imagem é estática, e não vai rolar trâiler algum. Somente uma sonoridade encantadora, que talvez tu nunca tenhas escutado, e que faz ainda mais sentido no decorrer das cenas. Entenderás melhor o que estou a dizer. Teus ouvidos e teus olhos, trabalhando em uníssono, fornecerão mais detalhes do que eu poderia, porque nunca estrago os prazeres que aguardam quem ainda não assistiu aos filmes dos quais escrevo... leia e ouça - nada de spoiler, garanto-lhe, caro(a) leitor(a).)

***

Talvez a mais bela película a que tenha assistido nestes últimos tempos. Que atuação, que esplêndido cenário, puro assombro!

Do diretor russo Nikita Mikhalkov, este filme veio para mostrar o terror das perseguições políticas de Josef Stálin - o grande açougueiro, comparável a Mao Tse Tung, ambos filhos de Genghis Khan. E talvez fortemente aparentados com o tão querido 3º Reich. Assassinos.

E é por essa temática que o filme espanta: como relatar o horror que grassou pela União Soviética nos tempos de seu grande ditador e usurpador, sem apelar à violência gratuita? Qualquer que seja a dimensão da resposta, o filme a atingiu - em cheio. "Nem tudo é como parece", faz-nos refletir. E que nem sempre o lado para o qual pendemos é o lado harmonioso da balança.

Criminosos de gala, no portar, no assobiar... quem diria! Kotov! Ai quando tomamos parte de sua verdadeira história! Dói-me.

A trilha sonora acompanha-o em sua magnanimidade. Tão grande palavra, pois tão grandioso filme. Eduard Artemyev é a mão mágica que conduz as cordas e nossas emoções, que faltam jorrar no decurso dessa obra sem parâmetros.

Como não é divulgada? Por quê? Isto sim é cinema. O discurso acompanhado do ritmo e da harmonia. A eloquência, a voz que não quer calar - e que não cala. Bem, digo que gargalhei de alegria em algumas partes, e que em outras fiz-me mudo.

Ficar em silêncio é o primeiro passo para descobrir certas facetas de nossas vidas que pairam por detrás das mágoas. Descortinando-as, avistamos aquela paisagem dependurada na parede há tempos, já empoeirada, à qual não dávamos atenção. Anos se passaram. Certos objetivos, certas metas... simplesmente transcorreram, tal a ilusão do tempo.

E que cada momento vivido foi vivido. Mas o vivido sujeita-se ao olvido, tão rápido como a terra verte-se em lama pós a chuva. Se as memórias nos fazem relembrar, e relembrar é reviver, mui bem. Porque só se sabe o que se tem, quando estamos sem.

Quando estamos zen.



[Se o vídeo não carregar, eis o link pro youtube: Artemyev. Desculpe a inconveniência.]

Após o sol ter nos enganado, é que vemos qual a mão jogou o dado.

Ó, e que lástima!

Quem mais amávamos...

terça-feira, 10 de março de 2009

A Excomunhão da Vítima

Foto: Clemílson Campos/ JC Imagem

Miguezim de Princesa*

I
Peço à musa do improviso
Que me dê inspiração,
Ciência e sabedoria, Inteligência e razão,
Peço que Deus que me proteja
Para falar de uma igreja
Que comete aberração.

II
Pelas fogueiras que arderam
No tempo da Inquisição,
Pelas mulheres queimadas
Sem apelo ou compaixão,
Pensava que o Vaticano
Tinha mudado de plano,
Abolido a excomunhão.

III
Mas o bispo Dom José,
Um homem conservador,
Tratou com impiedade
A vítima de um estuprador,
Massacrada e abusada,
Sofrida e violentada,
Sem futuro e sem amor.

IV
Depois que houve o estupro,
A menina engravidou.
Ela só tem nove anos,
A Justiça autorizou
Que a criança abortasse
Antes que a vida brotasse
Um fruto do desamor.

V
O aborto, já previsto
Na nossa legislação,
Teve o apoio declarado
Do ministro Temporão,
Que é médico bom e zeloso,
E mostrou ser corajoso
Ao enfrentar a questão.

VI
Além de excomungar
O ministro Temporão,
Dom José excomungou
Da menina, sem razão,
A mãe, a vó e a tia
E se brincar puniria
Até a quarta geração.

VII
É esquisito que a igreja,
Que tanto prega o perdão,
Resolva excomungar médicos
Que cumpriram sua missão
E num beco sem saída
Livraram uma pobre vida
Do fel da desilusão.

VIII
Mas o mundo está virado
E cheio de desatinos:
Missa virou presepada,
Tem dança até do pepino,
Padre que usa bermuda,
Deixando mulher buchuda
E bolindo com os meninos.

IX
Milhões morrendo de Aids:
É grande a devastação,
Mas a igreja acha bom
Furunfar sem proteção
E o padre prega na missa
Que camisinha na lingüiça
É uma coisa do Cão.

X
E esta quem me contou
Foi Lima do Camarão:
Dom José excomungou
A equipe de plantão,
A família da menina
E o ministro Temporão,
Mas para o estuprador,
Que por certo perdoou,
O arcebispo reservou
A vaga de sacristão.

(*) Poeta popular, Miguezim de Princesa é paraibano e está radicado em Brasília.


***

Psicopatas Fazendo a Festa
(minha versão)

A fera enraivecida tomou o chicote da Inquisição
Brandindo e gemendo, ressuscitou em si o Cão
Observar os estupros cometidos, e vir dar o seu perdão
Ao estuprador, coitado, também um filho de Deus...

Que talvez tenha um cérebro de macaco,
Regulado pelos mecanismos penianos...
Um chimpanzé que idolatra o saco
E aterroriza seus confrades humanos

Mas ainda assim criatura de Deus...

Um ser humano que não se arrepende
Que solto irá estuprar novamente
E não há transa que o contente
Ele curte dominação
Até na cela da prisão

Corre, pega, ele gosta de comer
Se correr o bicho pega
Se ficar o bicho come
E ainda assim humano...

Controlado pelos instintos mais básicos
Remorso: inexistente
Culpa: não sente
Mas ainda assim humano...

Pronto para se ajoelhar e rezar
Antes de sair pra estuprar
O que a sociedade quiser
Ele vai nos encenar

Porque o que deseja de verdade
É estuprar
E se nem a Lei o segura
É o santo padre
Quem o vem ajudar...

Um mundo ignorante e nas trevas
É tudo o que o psicopata mais sonha...
Nos aguarda o futuro, e uma realidade medonha.

segunda-feira, 9 de março de 2009

Down by Law (1986)


Uma impressionante produção do cinema independente americano. Jim Jarmusch dirige esse espetácuo, no qual você passa a conhecer: Jim. Zack. Bob. Três homens que não se entendem, habitando uma mesma prisão, e, ironicamente, uma mesma cela.

Um filme que se delineia, sobretudo, pelo elemento surpresa. A trilha sonora faz jus à bela fotografia e atuação, ao iniciar e desfechar a película envolvendo-a numa balada jazzística e instigadora. O Jazz, constata-se na literatura de Cortazár, é compassado pelo inusitado. Julio Cortazár era um bom entendedor de Duke Ellington e desse gênero musical provocante, repleto de nuances vocais e intrumentais, e as linhas escritas por esse talento literário não mentem a vivacidade de sua musa inspiradora.

Levados pela rítmica trilha e pelo bonito preto-e-branco, notamos, em determinada cena da película, a repetição de uma circunstância, isto é, um assombroso mise-en-abîme! É fantástico, exatamente como Cortazár. Quando um local desconhecido e alheio rememora, minuciosamente, um outro lugar que já conhecemos como a palma de nossas mãos, é literalmente a definição de uma forma de déjà-vu, o déjà visité. Aliás, uma das manifestações menos comuns de déjà-vu. E é claro: um déjà-vu é, por essência e substância, uma experiência transcendente.

Para quem já teve a experiência d'um déjà-vu forte e marcante, sabe-se muito bem a particularidade e o caráter único desse fenômeno. Justamente como esse brilhante filme. Jazz me recorda Cortazár... Cortazár é a literatura dos mise-en-abîmes e déjà-vus. Down by Law teve o êxito de reavivar todos esses aspectos na convolução de meu ser.

A História de Adèle H. (François Truffaut, 1975)


Mais do que uma historieta de amor, François Truffaut põe na tela os desencantos e desilusões que vivencia uma jovem apaixonada, Adèle H. Sua verdadeira identidade só nos é revelada posteriormente, com ótimos resultados, cabe dizer. A tênue, e não raro escorregadia, margem que delimita amor e obsessão é escancarada frente aos olhos impressionados do espectador.

Poderia tão facilmente discorrer sobre mais uma jovem burguesa, branca, casta e ingênua que vive maritalmente todos os prazeres e amores, sempiternos como somente a ficção pode assegurar... mas não! esta linda e inteligente jovem, com um germe literário e musical imbuído em si, vê-se face a face um álgido muro: um homem que a despoja e a despreza, inventando toda sorte de percalços para ver-se livre e longe dela.

Não sendo particularmente vistoso de corpo, e absolutamente desprezível de alma, indagamo-nos: Por quê? Por que obstinar-se correr atrás daquele que a afasta e a vilifica, e que deliberadamente a subordina e ignora? Não seria mero fruto da imaginação viver anos ao lado de quem menos a faria feliz, visto sua arrogância e vileza de caráter? Algo está errado, sim; todavia, esse algo só o vemos como espectadores, gratificados com o dom da imparcialidade, justamente porque não é conosco...

É bem capaz - e, para mim, unicamente plausível - que Adèle de fato ame a imagem que tem daquele homem. Mas é uma imagem desgastada, imperfeita, e que não corrobora um aspecto sequer da realidade daquele bruto. É o espectro fantasma de um homem por quem Adèle se amasiara em sua mocidade, o qual, passados anos, já não é mais o mesmo. Não é mais o mesmo porque mudou, mutou, transfigurou? Não. Porque a máscara caiu, e co'a máscara, toda a encenação circense.

Panis et circensis: é o mundo em que vivemos. Encurralados na caverna, tomamos sombras e cavas impressões por realidade. Mas que realidade esta, se até mesmo o Poeta é, primordialmente, um intérprete?

Não queremos ver o que nos abala, pois o que nos abala nos chama à luta. E a luta é o único meio que conduz à vitória. Algo em nós nos deseja dormentes e complacentes, para que conformemos à derrota.

Porque, uma vez desacorrentados, só Deus sabe o que iremos descobrir... Os pontos fracos da Matriz. O olho do dragão.

Vitória Régia

Pra que serviu treinar, então, filho?!

***
Seis horas da manhã, sábado. Saio de casa, preparando-me ao desafio que me esperava. Aguardo o ônibus, perco a paciência, atravesso a pista e pergunto ao homem do posto, que estava ocupado. Chama seu companheiro, para o qual repito a pergunta - não passa por aqui tal ônibus de sábado. Não sabe. Eu volto a olhar os ônibus que chegam. Olha o meu, pqp! No caminho, nada de especial.

Chego. Vinicius e Augusto César, sentados, esperando quem faltava. Cumprimento-os, decidido, ótima auto-estima. Aquecemo-nos e depois partimos para o ginásio, onde se dariam as partidas de tênis de mesa. Piadinhas sobre japoneses que fazíamos antes de nos dirigir para lá arrefecem ante a habilidade demonstrada pelos mesmos.

Justamente antes do jogo, eu e Vinicius dialogando, preparando-nos psicologicamente para o embate esportivo que estava prestes a começar. Adversários fortes, mas nossa resolução em dar o melhor mais ainda. De chofre, instala-se o que julgávamos uma brincadeira entre nosso técnico e o técnico nipônico até então desconhecido, de uma equipe contra a qual só jogaríamos depois do primeiro jogo, se ganhássemos. Era brincadeira, até que um derrubou o outro no chão, e passou a esgoelá-lo. Algo como filme de artes marciais. De um segundo para o outro, da terra para o chão. Vamos lá! Disse-me meu comparsa.

Apartamos a briga, e daí nada mais foi o mesmo. Moral abalada. Como que se dá uma briga num ginásio esportivo, logo antes dos nossos importantes jogos? Como isso? Bem o nosso técnico, nosso representante, quem nos deveria dar força e garra e espírito olímpico?! Absurdo camusiano. Se apenas fosse um árabe. Se apenas a terra estivesse quente, e a visão embaçada, e a arma na mão fosse provida de um gatilho de vida própria. Mas não era nada disso. Frente à provocação, perdemos antes mesmo de jogar. E não foi jogo, porém combate.

Psicopatas - e seus congêneres - arruinam o mundo.

***

Para aprender mais um sólido fato sobre a nossa existência, mãe: que nem todos somos iguais. Que nem todos nutrem empatia, que nem todos pensamos em pelo menos parte dos nossos atos, sopesando causas e conseqüências. E que por isso toda e qualquer moral, toda e qualquer ética esportiva e existencial vão água abaixo, como nossas ilusões sobre igualdade. Que seis por cento da população consegue influenciar-nos por meio da religião, da política, da malandragem. Nomeie qualquer esfera de influência de sua vida e lá os terá: psicopatas, sim. Eles existem, e nós conhecemos um bocado deles. Um bocado, eu digo!

É a resposta que eu poderia ter dado à minha querida mãe.

Feliz dia internacional da mulher!

quinta-feira, 5 de março de 2009

Ángel

Tem pessoas que nos fazem ver a vida como ela é.

Mesmo sem saber que elas têm esse dom, elas de repente nos fazem crescer.

É curioso viver ao lado de tais pessoas: cada átimo, cada momento, cada segundo... viram unidades imesuráveis de tempo, o mais próximo do que eu poderia designar eternidade.

Ou essas pessoas são raras no mundo, ou só as encontramos quando estamos preparados.

Como é possível aprender tantas coisas em um tão curto espaço de tempo? Acho que já respondi essa questão: é a eternidade.

É uma aventura - que por ventura - nos marca.

É se sentir vivo, em chamas, até o fogo se apagar - abrindo espaço à reflexão. É ser apresentado ao gosto de viver, ao gosto de rir e de se divertir, sem precisar de muito.

Apenas aquela boa companhia.

Não. Não acontece todo dia.

É para se tornar único.

E belo.

;D you made me live.

And it's kept me alive.

I've learnt how to grieve.

In a tentative, unimaginable dive.

segunda-feira, 2 de março de 2009

O Canhoneiro do Yang-Tsé (The Sand Pebbles, 1966)



Este filme é um marco. Pôe-se ao lado de Os Sete Samurais (Shichinin no Samurai, 1954), de Akira Kurosawa e de Doutor Jivago (1965), de David Lean, no patamar da alta cinegrafia: aquela que nos tem algo a contar. Mais que um filme, é um ensaio sobre as chagas da guerra, e o alcance do heroísmo. E mais, vai além desses mesmos conceitos, pois os questiona no início, no meio e no fim, deixando a nós, espectadores, entre a cruz e a espada.

Jake Holman é um engenheiro designado para servir na costa chinesa, operando o maquinário da canhoneira estadounidense Sand Pebbles ("Grãos de Areia"). Mal tendo chegado lá, é recebido com as seguintes palavras, nada calorosas ou animadoras, do - entretanto - amistoso Frenchy: "Ela [a canhoneira, nossa embarcação] chama-se Grãos de Areia (Sand Pebbles). Nós somos os grãos de areia." Frenchy de fato está certo. Os incontáveis grãos de areia de uma praia são únicos pelo fato de nela estarem. Porém, uma vez retirados de seu solo natal, descaracterizam-se por completo, e podem integrar a figura homogênea de qualquer outra praia arenosa. Tal pronunciamento, é óbvio, terá sua repercussão no desenrolar do filme.

A análise fílmica, ao deparar-se com o que eu denominaria produção clássica do cinema, chega a ao menos uma importante conclusão: Obras como Spartacus (Stanley Kubrick, 1960), Os Sete Samurais, Doutor Jivago e O Canhoneiro do Yang-Tsé - entre outras merecedoras do renome - contêm nos diálogos a chave do desfecho. E, por serem filmes particularmente longos, almejam sobretudo a reflexão do espectador. Almejam que este pense por si mesmo, em tomadas nas quais não predominam cenas de ação, ou de suspense, terror ou caos. O que há são diálogos que abrem horizontes do pensar, e modos alternativos de interpretar e assim vivenciar aquela realidade descrita e mostrada.

Filmes que deixam o sexo em segundo plano, não por este ser vilipendiado pelos diretores de então, ou por ser repudiado das telas por parte da sociedade. Pode ser, sim, que ambos os fatores tenham existido, para não mostrá-lo em uma cena sequer. Todavia, o espectador atento nota que o sexo, ali, ou aqui, ou em qualquer momento que fosse do filme, nada acrescentaria. Parece mesmo que tais diretores lograram o êxito de compor um todo hermético. Não há o que acrescentar, nem o que extrair. Não há retoques ou tomadas passíveis de substituição. Como no caso de um bom livro, a substância formadora dessas obras seria prejudicada caso houvesse a menor intervenção que fosse.





Steve McQueen, que atua no papel de Jake Holman, o protagonista da película, mostra uma performance de arrepiar os pêlos - de nos faltar o ar. Com destaque à cena final, que não vou contar, pois nada justifica um comentário spoiler, que estrague o bel-prazer do cinéfilo. Mas eu ressalto - sou useiro e rezeiro, oras! -: o último monólogo, as últimas linhas, conseguem fechar o filme de forma fascinante e assombrosa. As linhas e as sendas que se abriram no prenúncio do filme encontram um destino convergente no término conclusivo de um filme épico. É épico porque grava uma determinada mensagem da guerra que não iremos esquecer.

Não, longe de um pacifismo barato e supostamente covarde, há no imo do filme um papiro, que, uma vez aberto, revela as seguintes palavras: olhai a guerra! olhai atento à miserabilidade dos homens convocados a lutar por uma causa imperialista, ornada com falsas pretensões de se estar protegendo o próprio país, com enganosas nuâncias de se estar lutando contra um Mal absoluto e contraposto à bandeira de nossa nação - "nosso inimigo". O que é o inimigo? Quem é o verdadeiro criminoso?

O peão de guerra? Aquele que é despojado com o mesmo sorriso de escárnio reservado a grãos de areia apanhados - e descartados -, a esmo, à beira do mar? Quem somos nós que lutamos por causas alheias à nossa vida diária, que temos de obedecer ordens ufanas e distópicas que nos levam ao ataúde, ao mármore do cenotáfio, ao esquife, ao ulterior estertor da morte? Quanto vale a vida de homens portadores de armas, que seguem do catafalco ao cadafalso, numa vida construída à beira da destruição iminente, e de um aterrador mise-en-abïme, no qual os soldados acordam de um pesadelo para descobrirem que estão inseridos num ainda mais cavernoso e inescapável.

...

O soldado vai à guerra, o soldado volta à terra
Que o germinou, que o nutriu, que o fez emergir
Para então rastejar, e então andar, e de lá correr
E assim crescer, tornar-se adulto e ser haurido...

Enfrentado seus piores medos, pelejando, vitalício degredo
Não tropeçará em pedra, mas topará com o maior Penedo:
A morte, que depende da sorte, intrínseca à vida, que já não é sua...

...




Em meus artigos Crianças de Huang Shi e Spartacus, aludi ao heroísmo existente no peito de certos homens. É necessário mais do que a tão chauvinista hombridade para arcar com tamanha responsabilidade perante à humanidade. Homem ou mulher, órfão ou pai, pouco importa. Há pessoas que fazem a diferença, não por serem grandes estrategistas bélicos, como Hitler cria ser, assim causando mortes de milhares e milhões de inocentes civis de seus gabinetes pomposos; mas porque tais indivíduos vieram ao mundo com um tato e uma carisma todos seus. Porque objetivaram, desde cedo em seus corações, devolver, ao Mundo, Sua dignidade perdida.

Sacrificar a própria vida em prol dos outros é um ato veementemente ignorado por esta geração fornicadora e leitora de jornais, tal qual a sociedade prevista por Albert Camus - em seu romance A Queda (1956): a mulher grita por sobre a ponte, mas não é ouvida... Oras! Ouvimos, nós, algum som que não nossa própria voz? Vemos, nós, imagem que não nossa própria, nos outros, nas coisas? O narcisismo obscurece o heroísmo. O arquétipo da atitude heróica jaz na capacidade de abstrair a própria existência, para, então, enxergar a existência do outro, e vê-la com olhos límpidos o suficiente para poder se abdicar da auto-piedade consigo mesmo. Com a efêmera existência de um corpo, que pode ser usado, num ulterior esforço, para resguardar a vida de outrem. De mais de um, de vários. Escolher a própria morte, num átimo de consciência desobstruída, e encarar o fato de forma natural, porque somente com sua vida poderia salvar a vida de todos que dependeram de você para escaparem. Escolheu o destino que os abraçaria, caso recorrese a um modus operandi narcísico.

Num modus operandi narcísico, o inferno são os outros, fazendo uma citação sartriana. Olvida-se muito rapidamente que os outros somos nós, e nós somos os outros, porque a Natureza só existe na Unidade da Diversidade - e sem o Diverso não se formaria o Uno. O heroísmo é mais que um mecânico e inconsciente e geneticamente programado esforço destinado à continuação das espécies. O heroísmo requer caráter, reflexão existencial e empatia.

Um psicopata é simplesmente incapaz de um ato heróico. Este filme atinge um status digno, ao distingüir a coragem da covardia. A atitude psicopática e narcísica, da atitute verdadeiramente altruísta. Para salvar seus próximos, quão longe você iria?

Possivelmente, não tão longe.

domingo, 1 de março de 2009

Transigi

Viajei, transcendi
Paisagens diversas - eu vi.

Em cada localidade,
Uma parte de mim...
Desta saudade...
Um não, um sim.

Adeus, promessas!
Deixei-as de lado
Me puxavam ao vão
E foi de bom grado
Que delas larguei mão...

Is there anybody out there?

A solidão vem e vai
Sou quiçá o corpo que cai
Numa praia deserta
Co'a mente aberta

Posso não ser o maior dos descobridores
Posso não conhecer minhas dores
Minha alma
Posso não ter descoberto a calma

Mas uma coisa eu digo:
Fiz em vida um amigo:
O momento só -
De refletir, sozinho,
Por que caminho rumar...?

Que destino escolher...?
Em que vaso crescer...?
Optei por um bosque amplo,
Com visão pro horizonte

Belo e límpido, como o rosto dela.
Sei bem, querida, vossos pensamentos não mais estão em mim...
E que os meus já não condizem aos teus.

Já passou a ilusão de que ficaríamos juntos
Porém pensar a noite nela, é o apagar d'uma vela
Sei que já não monto o cavalo, e que este vai sem a sela

Ele está livre, oras!
Liberto para conquistar novos ares
E eu, novos mares!

Singrarei por todos eles com o pensamento cá,
E ela,
Com os dela acolá...

Não há como negar...
O fim daquilo foi o começo disto...
E a ela tenho tudo a agradecer

Por ter fechado a pequena e sombreada janela
E aberto uma porta dupla e espaçosa o suficiente
Par'eu olhar através, de viés, e ver no mundo
Outra formas...

E pensar que não nos falamos novamente...
Mas o que teríamos para dizer um ao outro?

Ambos vivem hoje vidas distintas
Passado meio ano
E nada do que cri, então, foi verdade
Não fiquei insano,
Já é ida a saudade!

Aprendi contigo, sarça ardente!
Fiquei momentaneamente cego com a luminosidade da visão
Mas ouvi atento à voz que me chamava:

"Sê ti mesmo, hombre!
Vislumbra o íris que incandesce o céu:
Lembrar-te-ás do que viveste comigo,
Sem padecer de nostalgia"

"Como às águas, nossos tempos vividos
Parecer-te-ão ficção, talvez magia.
Assim verás melhor:
Cada novo raiar,
Um novo dia..."

"Pois ao teu lado tens um amigo,
Tens teu irmão.
Escolheste viver momentos ao meu lado
Para se aperceber que não há separação..."

Aye, aye...
I was blind...
Now I see why.

I felt you in the flesh
We're no more enmesh'd
For all our best...
Bygone triangle mesh!

Once upon a time... our reality.

Was it an illusion?
Well... I learn'd from it!
Without having to wait for the worms...

I live: I g-i-v-e.