domingo, 28 de fevereiro de 2010

Ruptura

Não sou mais que sombra
De ervas alheias
Envolto em amarras
Atado a peias

Mentiras eu conto
Eu conto às mãos-cheias
E como num conto
Encanto as sereias

Eu pulo no lago
Encontro o mago
Fico até gago
Ante a surpresa

O leito está vago
Carente de afago
Eu deito ao lado
Da cruel princesa

Sorri licorosa
Seu buço já rosa
Do muito batom
E pouco bom tom

Admirado bocejo
O rosto babado
Roubaram meu sonho
Meu real sonhado

sábado, 27 de fevereiro de 2010

Tique-Taque

Um peteleco no boneco
Para ele acordar
O trabalho eu exijo
E excluo o bem-estar

Eu sou a máquina
Eu sou o tempo
Eu sou um crápula
Sem sentimento

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Ícaro Amou

Eu estou amando
Valioso amigo
Vivo e vou cantando
Um soneto antigo

Sobr'a dor do amor
De amar alguém
E assim me pôr
No áureo além

A tristeza que acompanha
Essa estranha sanha humana
Um amor que a tudo irmana
A gana de viver redescoberta

É esta a minha oferta
E mais fiel procura
O amor que em erro acerta
E na dor vivida cura

O ressaibo de aventura
Tingindo rubro os lábios
A eterna fé perdura
Na mente dos mais sábios

O voo do candor
Ao longo horizonte
Ícaro e suas asas
De cera rebeladas

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Na Sala de Aula

Na sala de aula
Eu ouço e aprendo
De dentro da jaula
Eu colho remendos

Juntá-los inteiros
Meu ser curioso
Não quer dinheiro
Só e tão-só o gosto

De poder escutar
O marulho do mar
Que vem em palavras
E vem me encantar

A lousa vazia
Tão cheia
De rabiscos mentais
Se incendeia

É tão belo o ensinar!
No calor da lareira
Eu estou no meu lar

A imóvel cadeira
A tudo aspira
E tudo cheira
Fico mudo à mi'a maneira

Papeando calado
Já não estou só
O sábio ditado
Da minha avó

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Em Meditação


O frugal jejum do monge
Nos primores da manhã
Penumbra negra esconde
Seu roto tecido de lã

O mantra balbucia
Em genuflexão
Crer sempre no dia
Que não se vai em vão

O soquete de luz
Pendendo no teto
Sua mente traduz
E o deixa quieto

Sentir-se completo
Em seus fragmentos
O Todo o abraça
Tão rápido e lento

A mais dura lição
Ver o sol que perdura
No trêmulo chão
O fel da amargura
O mel da canção

Olhar com candura
A tênue existência
Efêmera, paradoxal
Viver cada hora o Tao

Ver a ordem no Caos
Do cotidiano insano
Os bons e os maus
O valor humano

A prece erguida
A buda e jesus
Desmedida e muda
Um clarão de luz

Conhecer-se dói tanto
E é tão fugaz
No riso e no pranto
Reina a paz

De quem faz e apraz
Sua vontade sincera
E nela se esmera
Co'a força tenaz

Em meditação.

***

Nota: Buda e Jesus com as consoantes iniciais intencionalmente minúsculas neste poema, por razões de um espiritualismo desse monge (que não sou eu...vale dizer) que não admite fronteiras ou barreiras entre religiões, nem deificações extremadas e monoteístas de seus mais afamados expoentes.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

sábado, 20 de fevereiro de 2010

O Mal do Canavial


Soa o sino na capela
Mão fechada sobr'o cabo
O sol a pino da janela
Pé de cana já ceifado

Veias grossas como artérias
Vivas pulsam em estertor
Essa vida a sol é séria
Estonteada no calor

Forte cãibra treme as pernas
Apoiadas sobr'o solo
Nossa força subalterna
Debruçada sobr'o colo

Cana doce tão amarga
É medida em toneladas
Para azêmolas de carga
Sob os raios esfalfadas

Rostos jovens encobertos
Pela aba do chapéu
Um destino tão incerto
O impiedoso céu

A terçã monocultura
E a febre do facão
Nossa ênea pele atura...
Cessa o ar par'o pulmão

A colheita já madura
Fornece o nosso pão
Essa ceia sem fartura
Uma letra sem canção

Bruta luta sem permuta
Sob o áureo firmamento
Se Deus a tudo escuta
Pois fique, então, atento

Com todos seus rebentos
Esfaimados nesta lida
Meu terçado cai gemendo
Minha alma perde a vida.

***

Nota: Trabalhei fazendo o inventário de fotos do Museu da Imagem e do Som de São Paulo. No todo, percorri meus olhos por 5.164 fotos. Foram três meses de um trabalho recompensador por todas as descobertas que me trouxe, apesar da tremenda dificuldade em conciliar 8h de trabalho a 4h de aulas, de segunda à sexta. Entrava no trabalho às 9h e saía às 18h, pegava o Butantã-USP ou Cidade Universitária e descia em frente ao Instituto de História e Geografia, de onde andava até a Letras, que é o meu curso.

Minhas aulas começavam às 19h30. Muitas foram as vezes em que cheguei atrasado, e todas foram as vezes em que lá cheguei cambaleando de cansaço, sono maldormido, e premido na difícil escolha entre abocanhar alguma coisa pra enganar o estômago ou seguir direto pra sala de aula, a fim de pegar um bom lugar, mesmo tendo apenas o almoço e o café da manhã na barriga. Afora todo esse corre-corre, passou-me pelas mãos um ensaio fotográfico do qual esquecerei jamais, realizado pelo exímio fotógrafo Juvenal Pereira. Chama-se Canavial, e consiste em fotos P&B que flagram a árdua labuta de um canavial, focando desde as mãos esburacadas e os braços inchados dos cortadores, até o rosto vincado e a própria plantação e instalações nas redondezas.

De forma que este poema não é nada mais do que meu veio poético acordado pela singular experiência ocular que tive ao inventariar esse ensaio magnânimo. Obrigado, Juvenal Pereira, e obrigado, leitores.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Where We Once Used To Meet

© 2005 Martin Liew

A halo of light on the street
Where we once used to meet
On rendezvous so docile
So docile and discreet

Lamps above us suddenly lit
Crazy laughing crazy running
As we were hurriedly forced to quit

Our rendezvous so docile
And discreet
Below the joyous glow
Of the halo lamplights
On the street

Where we once used to meet.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Mosaico Incompleto



Se necessário for
Com lágrimas compor
Um mosaico laico
A versar sobr'a dor

Do indivíduo humano
Dividido, insano
Em cor, religião
Raça e etnia

Sujeito ambiguamente
Ao ódio e ao amor
Sujeito, sempre
À máscara da dor

Por que tal misantropia
E tamanha raiva
O outro se atrofia
E nem a água lava
A imersa mágoa

Sequer a água leva
Em seu fluxo corredio
Essa dor primeva
No correr do rio

Tiritando de frio
O homem agachado
Esvazia o seu cantil
Num sorriso largo

O pote já vazio...
É senão o próprio fado.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Ó a enchente, minha gente

Não me recuso a ser recluso
Enclausurado em minha cela
Não quero entrar em parafuso
Neste mundo bagatela

Me falaram da verdade
E onde ela está...
Eu só vejo a vaidade
E a consciência má

Dia a dia me rebaixo
Sob botas, sob ordens
São todos muito machos
E pelo osso mordem

Uns aos outros
Ladram soltos
Cães com baba
No pescoço

Escorrendo a contragosto
Molham a barba já bem suja
E o pergaminho tosco
Embebido em garatujas

Lá se escrevem leis
Repletas de brechas
Dirigidas aos reis
Copiadas com pressa

Onde dois mais dois é três
E fim de papo
Quem contrariar de vez
Toma no ato um sopapo

Os ricos se safam
Quem não pode, implora
Gargalham os poderosos
E se mandam embora

Dona Rita, uma senhora
Foi desalojada
Ajoelha e ora
Na beira da calçada

O dilúvio de Noé
Chegou de surpresa
Quem não tem fé
Não pôde acreditar

Sem arca nem barca
Ruas nuas inundadas
Malsã água pútrida
Mães e filhas afogadas

Nadar no lodo pardacento
É de ficar na memória
Aquele lento momento
De sobrevida inglória

Mas a história se repete
Ano a ano é o descaso
Em páginas de internet
Lê-se tudo sem atraso

O pouco caso do governo
É fenômeno corriqueiro
Uns no céu, outros no inferno
O assunto sempre o mesmo
Pouca verba, falta dinheiro!

Dona Rita e seu filho
Foram protestar
Na boca o estribilho:

Queremos nossa casa
Queremos nosso lar!
A prefeitura sempre atrasa
Agora é hora de mudar!

Pá Paf Pof Pum
Balas de borracha
Spray de pimenta
Esmaga a populacha!
Que pobre tudo aguenta!

E no medo se afugenta
E na mídia se distorce
Decifração lenta, lenta
Desse código Morse

As eleições chegando
A revolta noticiada
Mas de um jeito brando, brando
Parece até piada

Mas é isso mesmo...
Povão da pelada
Mi'a pobre gente
Amanhã tem torresmo
Um brinco de feijoada!
Político nunca mente...

Só dá uma disfarçada.

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Iracema, ou, Martim Perde a Razão

Iracema (Antônio Parreiras, 1909)

Você é tão formosa
Parece até um mamão
Que a gente aperta e apalpa
Co'a lisa palma da mão

O vermelho das bochechas
Rubi com'as madeixas
Fabulosa sempre
Uma perfeita gueixa

Sem pintas nem tinta
Você é a Mulher
Mais linda do mundo
E ainda assim me quer

Eu mal te conheço
Eu nunca te vi
Nem sei se a mereço
Por que você ri...

Não, não te idealizo
Contento-me em teu riso
Canoro bem-te-vi

Sonho e choro
Em teu busto
Inteira te adoro
Teu rosto augusto
Teu timbre sonoro

E por que é que choro...
Se você é mi'a alegria...
Pois agora me recordo
Do momento em que partia

Levou consigo meus poemas
Minh'antiga cantoria
Por que partiste, Iracema
Minha vida é tão vazia...

Moacir e o rafeiro
Estão comigo neste barco
Sou Martim, o ex-guerreiro
E na dor do amor me marco

Amada, eu não minto!
Vivo em ilusão...
Neste negro labirinto
Neuroses, loucuras, esfinges...
Eu remo sem rumo
E remo em vão.

sábado, 13 de fevereiro de 2010

O Deserto é Tão Perto

Beduíno

Em meio ao deserto
Tórrido e distante
Lavarei mi'a vida
Num único instante

Uma bata açafrão
Usada e surrada
Será o meu roupão
E mi'a una morada

Prostrado de joelhos
Sobr'o rude chão
Cairei de velho
Na erma solidão

Do tempo me afasto
Meu ido amigo
Morrerei casto
Em nada envaidecido

A cálida temperatura
Zurzind'o meu corpo
Mi'a consciência pura
Meu cérebro absorto

A plena e funda arena
Estendendo-se sem fim
Pristina e serena
Seus ventos vêm a mim

E sobr'a lona da tenda
Fixarei mi'a vista
O pano como venda
Experiência mista

Poder mirar o céu
Qual João Batista
Ver por sob o véu
Ainda qu'eu insista

Em temer aos deuses
Em seus tantos planos
Tão puídos, tão arcanos
Tal o próprio ser humano.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Uma Nota de Rodapé

Muriçoca na Maloca e Ovo Choco são o resultado de uma brincadeira à qual me lancei: exaurir o meu vocabulário de palavras findadas ou de alguma forma rimadas em 'oca' tanto quanto o contexto poético me permitisse. Cronologicamente, primeiro cumpri Muriçoca na Maloca e então Ovo Choco. Entretanto, não larguei o lápis entre um e o outro, visto que tão logo havia terminado Muriçoca na Maloca, apercebi-me num repente do desafio à minha frente: quantas palavras eu sei com 'oca' no fim, e que efeito terá o poema com tais palavras delineando sua textura sonora?

Há quem pinte, desenhe, esculpa, professe, invente, improvise, brinque, jogue, lute, viva. Mas pra mim não há nada mais prazeroso e recompensador que os meus próprios duelos poéticos. Exigem concentração, rigor, precisão, silêncio. Jamais são feitos de dia, mas na calada da noite, quando tudo e todos dormem, e a paz reina. Eu tenho apenas uma letra bonita, noites insones e pensamentos bem concatenados. Afora minhas leituras. O resto é estorinha da arca da velha.

Lendo os manuscritos originais em letras miúdas a lápis, acredito que a brincadeira se saiu bem. E é claro que havia muitos pernilongos me azucrinando, senão eu estaria dormindo, não garatujando noite adentro. Minha família mineira (NE MG) ainda usa só 'muriçoca' para designar esse incômodo e onipresente hematófogo, que nós paulistas conhecemos apenas por pernilongos. Fazem graça de mim sempre que digo esse cultismo latino 'pernilongo'. 'Muriçoca' está em nossa raiz tupiniquim, pois vem do tupi. E meus queridos parentes bem se orgulham de usar essa palavra que soa tão curiosa, mas jamais feia.

Tanto Muriçoca na Maloca como Ovo Choco são de uma sonoridade leve, encantadora, quase infantil. E era esse mesmo o objetivo. Queria repousar minha mente um pouco sobre a temática da infância, do amor desinteressado, da sutileza de espírito que caracteriza esse áureo período de nossas vidas.

Enfim, é bom ser criança, e sem dúvida que todas as manifestações artísticas das quais podemos nos apossar estão calcadas na infância. Viva Macunaíma!!

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Ovo Choco



A minhoca
Lá na toca
Olh'a galinha
Brava e choca

Quantos ovos
Ela bota
É assunto
De lorota

Pinto preto
E amarelo
Cinza, branco
Caramelo

Bem quentinha
Se aninha
Enfezadinha
Sobr'a cria

Dois olhos apertados
Bem atenta
A ave espia

Mãe coruja
Bem sabuja
Cacareja
De ousadia

O bico alongado
A pena luzidia
Do céu o áureo sol
A tudo alumia

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Muriçoca na Maloca

Muriçoca vem
Entrando na
Maloca vem
Chupar o sangue
Da criança
Dorminhoca

E no ar já vem
Fazendo troca-troca
Um zunido
De chacota
Chacoalhando
As pernocas

Doce sonho de paçoca
Termina em pesadelo
Quando a tromba toca
A raiz do seu cabelo

Remexe o travesseiro
E com ele o corpo inteiro
O bracinho fino soca
Par'em vão errar em cheio

A picada pica e coça
Êê... vida de joça!
Não se pode nem dormir
Sossegado nesta roça

Vem fazendo troça
E zumbindo no ouvido
No sangue se remoça
Inferninho de castigo
Descansar na pobre choça
Este sono maldormido

***

Uma homenagem aos pernilongos que infernizam minhas noites.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

A Mão no meu Bolso e o Tapa na Cara


Que horas são?
É hora de pegar o busão!
Mas a tarifa aumentou...
Virei agora gigolô

Pagar a nova taxa vai ser duro
Eu vou pular o muro
Ou melhor, a catraca!
Que cheiro de inhaca!

Ambição, exploração
Isso deve dar tesão
Em quem ganha
C'o aumento

A sanha de lucrar
Vira logo argumento
Na hora de pagar
Vem um bodum
Qu'eu não aguento

O brasileiro
Topa tudo
Leva um soco
Fica mudo

E quem protesta
É baderneiro
O que não falta
É dinheiro

A essa gente
Imprudente
Inconsequente
Delinquente

Eles querem é
Parar as ruas
Com suas falcatruas
Par'a gente acreditar

Eles acham que andando
Tudo junto em um bando
Esvozeando e cantando
Alguma coisa vão mudar

A polícia vem batendo
Agredindo e ofendendo
Em um salve militar
Heil Hitler salutar...

Pede uma, dou-lhe duas
Sai da via, marginal
Dou-lhe uma sova
Que te mando pr'(h)ospital

Tua boca vai sangrar
Teu nariz vai arder
Pimentada nos olhos
Pra você nu'esquecer

E aprender que quem manda
Tem escudo, tem porrete
E no bolso um estilete
Pra poder te incriminar

Você é estudante, militante
Adolescente, aborrecente
O teu pai não te ensinou
Pois agora vou lhe dar
Mi'a lição de mandachuva
Uma bela duma surra
Pra de vez te entortar

***

Minha homenagem ao aumento superinflacionado da tarifa de ônibus.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

A Clava do Índio

Sobre os ombros, escombros
Assombram o meu ser
Caídas ruínas
Comigo vêm ter

Mi'a mente desfoca
Em pálidas lembranças
Do impávido índio
Dentro da oca

O tembetá no lábio
Um botoque também
O autóctone sábio
Agora no além

Disse-me com ternura:
Somente a palavra perdura
No cinza da cidade
Na densa selva escura

Mi'a gente ensinava
O Verbo é como lava
Imbui-se do Fogo
Dissolve a rocha fria

O solo ela cava
Infusa de energia
Desperta o pavor
Em ígnea rebeldia

Um feitiço a voltar-se
Contra o próprio homem
Em vivo rebuliço
Seu calor tudo consome

Memórias e histórias
Livros e divãs
Tomados pelas chamas
Sob o espesso picumã

Palavras proferidas
Enterradas
Soterradas

O silêncio
Só silêncio

E o lenço metido
Na boca amordaçada
O estalido da pólvora
Outr'alma penada

Palavra minha:
O fim do meu povo
Passou ante os meus olhos

Nossa linda língua
Acaba-se comigo
Sofremos à míngua
Sem branco amigo

Nossa rubra pele
Cor de telha
Em muito se assemelha
À terra fértil

Hoje combalida
Sob o poder do projétil

Ó, Brancos!
Fizeram de nós
Saltimbancos
Velhos e mancos
Um povo sem voz

Mas as palavras
Como lava
Hão de incendiar
Vossa gente ignóbil
Que despeitou o Mar!

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Hope Under a New Scope


To write about pain 'n strife
Is a must
Either to write
Or live in disgust

'Tis the choice
That dawns on me
To run my mind wild
To pluck the reigns free

To never be mild
Whenever Lies become a decree
To restrain conscient men
In hope they agree

This is slavery!
Sealing humankind
Blind and dumb
To crash us 'n crumb

And thus forget
The past times
When truth was sung
Aloud and live

In cries of joy
When human beings
Were more than toys
We're smitherings

Left in the dark
Of a dreadful age
Without true pilgrimages
Of the soul

Where only rage
Can be voiced out
Amid this eerie blackout
Of bygone sages

Our children will ask
The very questions
We were afraid to unmask

And answering truthfully
Will be the most gifted task
Of our lives entire

Lest we lose ourselves
Betwixt an endless quagmire.

sábado, 6 de fevereiro de 2010

Facing the Mirror

Kenichi and Takahiro in The Mirror
© Kenichi Ebina

Who are we, anyway
Our lives dull and gray
Filled with the emptiness of clay

Which game is it we play
Everyday so like yesterday
Terrified of what others will say
In a bout of rage and disdain

Are we alive
And ready to thrive
To the fullest we can...?

If not, at least in thought
The truest answer sought
Is Are we real men?

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Moleque de Pileque

Praça da Sé

Aquele moleque
Tava é de pileque
E a senhorinha ali
Ao lado, abanando
Seu bonito leque

Maltrapilha, malvestido
Morador de rua
E a rica dama
Em seu vestido
Cheia de drama
Vendo aquela cena crua

Ô, menino!
Você vive aqui na rua?
Vivo, sim, mi'a senhora
Não tem medo da patrulha?
Todo dia, toda hora
E te dão muita surra?
Bate tanto até que chora.

Pra viver aqui na rua
É preciso ter coragem
A polícia come o rabo
A mais pura pilantragem
Tudo ordens do Estado
Pra conter a "malandragem"

Ô, menino!
E você não passa frio?
Passo, sim, mi'a senhora
Não tem pai nem mãe nem tio?
Aqui no Rio... só meus irmão
Eles moram com você?

Não, tão na prisão
Presídio, detenção
Xadrez, podridão
Reduto da malária
Pátria sem perdão
Cólera, estupro
Só devassidão

Nessa terra sem lei
Quem tem olho é rei
Bem eu sei
É muita humilhação
Respeitar os coroas
No pedaço, feito palhaço
Um bando de safados

Todos os pecados
Tão lá dentro
Na cela fedorenta
Um cheiro pestilento
Que ninguém aguenta
O mais cruel momento
É quando a gente chega
Depois se acostuma

A cela é nossa vida
E a vida é só uma
Pra não perder a honra
É melhor entrar na "turma"

Só ela te protege
Mas em rebelião
Ninguém tá a salvo, não
Se alguém mexer contigo
Saca logo o teu facão

Matar pra ficar vivo
Só em último caso
Perigoso até demais
É vingança sem atraso
Vai embora a tua Paz
Tua morte vale um maço
E o Satã Satanás
É um homem de prazo

Sujeito ruim na cadeia
Claro que tá cheio
Cada dia é nossa
Última Ceia
Com o Judas lá no meio
Toda morte é morte alheia
Não tem dó nem regateio

Ali nego nenhum
Vai tremelicar
Pra manter a própria vida
E o próprio bem-estar
Me acabaram de soltar
Fui em cana por roubar

Fico agora mendigando
Pra poder me alimentar
Não quero tanta piedade
Só quero um dia ter um lar
Meu barraco, minha casa
Um lugar onde morar

Enquanto isso vou pedindo
Uma esmola, por favor
Mi'a cara esfomeada
Esconde um sonho e um amor
Jogar quem sabe uma pelada
Sob as Mãos do Redentor.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Canto ao Campo

Foto: Elisabeth Freeman

Meio a meio
Sem receio
Quero mais é
Dividir

O meu campo
De centeio
Com você
E quem mais vir

Amplo, ensolarado
O meu campo
Abençoado

Pardais e bem-te-vis
Cantam sempre por aqui
Pés de manga
Na varanda
Muitos pés de caqui

A relva molhadinha
De noitinha
Eu vislumbro
Da cozinha

Gosto tanto
Desta vida
E de ti
Mi'a querida

Venha! Toque
A campainha
Este lar é meu
Esta terra é minha

Meu coração
É todo teu
Teu somente
A ti sozinha

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Rito Pagão


Alô, meu bem!
Você não vem?
Eu vou pra Pasárgada
Lá sou amigo do Rei

E durmo na cama real
A rainha é linda, linda
Cheinha de sardas
E ainda pula carnaval
Que tal?
Não é fenomenal...

Lá não há dinheiro
Nem olhar sobranceiro

Daora é pouco!
Viver assim
É muito louco
Eu até fico rouco
Pois sou fanfarrão

Em dias de festa
Andamos pelados
Cantamos nas ruas
Esta canção:

"Upa! Opa!
Quem tá nu ponha roupa
Ai! Ui!
Já vai? Já fui!"

Sobe na garupa
É hora de ir
Pra beira do rio
Nos divertir

Dançando e cantando
Sob o luar
"Meu nome é Armando
Eu quero te amar"

"E o meu nome é Lisa
Gosta de mim?
Flecha do amor
Não precisa!
Sou teu querubim!"

Saltamos o fogo
Dum lado pro outro
Aqui não tem rogo
O corpo vai solto

A lua redonda nos diz
Estar vivo é ser feliz
La Gioconda o meu nariz!

Feio ou bonito
É puro mito
Nada belo é infinito

Nós pregamos vida livre
Mas na floresta
Temos tigres
Avessos a festas

Feras bem conservadoras
Peludas e listradas
Bestas agressoras
Mal-contidas
Mal-amadas

Não entendem poesia
Parecem ter azia
Ao ouvir literatura
Não têm nem alegria
Vivem com gastura

Fiscalizam os costumes
O certo e o errado:
Quem galgar o cume
Vai ser decapitado
Quem nadar pelado
Será devorado

A eles dedicamos
A nossa canção
Passam-se os anos...
Também eles passarão.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Holocausto no Horto das Oliveiras


À hecatombe palestina
Celestina-mãe
De toda dor do mundo


Deus nos deu seu adeus final
E eu dei-me por morto
Estendido no horto
No chão lodaçal

Botinas a esmagar
Mi'a terra e meu lar
Rotinas da guerra
Sempre certa,
Nunca erra.

De viés eu vi a arma
Do gendarme a marchar
Quão vil pisada
Quão teso olhar

As reiúnas do soldado
Orgulhosas a gerar
Medo, angústia
Dor e mal-estar

As lindas, fortes
Oliveiras derrubadas
A cartada da sorte
Sob mãos ensanguentadas

Alvo de piadas
De mau gosto
Humilhados tomamos
O tabefe no rosto
Deixados e sós

Ó, pata atroz!
Mãe do terror
Quem somos nós...
Filhos da dor!

Estrangulados em nós
Da corda genocida
Netos, pais e avós
Sem teto e sem vida

Querem nossa alma
Levam-na embora
Para a casa calma
Onde o diabo mora

Ele as devora
Sem demora
Num riso amargo
Livre do encargo

Da consciência
Que chora
Deplora e
Implora

Justiça e amparo
Um'outra vida
Mas custa tão caro...
Curar tal ferida

Covarde, infligida
Num povo inocente
Essa seca cuspida
Noss'alma sente

Todo dia mentem
E consentem
C'o nosso holocausto
Digno de versos!
Digno de Fausto!

Valores inversos
E nós no calabouço
Na escuridão.

Quer tamanha tristeza...
Viver no porão
Sem a luz
Sem razão...

O suíno nos conduz
À eterna prisão
Vítimas da cruz
E da difamação

Os bravos bradarão
Contr'a cruel invasão
E ilícita pilhéria
De nossas vidas

Detidas
Torturadas
Sucumbidas

Mas a mentira...!
Convence e prevalece
Suplanta qualquer ira
O invasor enriquece
Decreta morte à Lira
E assim fenece a
Nossa Nação

Não dirigi vós preces
A esta messe
Diabólica!

Não prestai atenção
À mentirosa
Retórica!

Sob borzeguins
Nós morremos
Sob a prole do demo

Uma queda sem fim
Sob o descaramento pleno
Lento veneno...
Inoculado.

Cristo no Jardim das Oliveiras, Andrea Mantegna

(...)Chegaram a uma granja chamada Getsêmani, e Jesus diz aos seus discípulos: "Ficai aqui enquanto Eu orar."

Depois tomou consigo Pedro, Tiago e João e começou a sentir pavor e angústia. E disse-lhes: "A Minha alma sente uma tristeza de morte; ficai aqui e vigiai."

Adiantando-Se um pouco, prostrou-Se por terra e orava para que, se fosse possível, se afastasse para longe d'Ele aquela hora. E dizia: "Abba (Pai), tudo Te é possível: afasta de Mim este cálice; contudo, não se faça o que Eu quero, mas sim o que Tu queres."

Texto bíblico: Pe. FLORENT. Jesus, A Sua vida, narrada pelos grandes artistas plásticos. Lisboa: Verbo. 1985.

***

Ofereço este humilde poema e a sacra dedicatória que o segue aos palestinos e em especial a Ghassan Kanafani (1936 - 1972), o escritor dessa santa terra que tanto lutou com palavras contra o estado sionista vigente em Israel, e foi por isso assassinado pelas mãos da Mossad.

***

Outros dois poemas de minha autoria com inspiração palestina:

Gaza, em brasas, gritou

Wayward road to Gaza