quinta-feira, 30 de abril de 2009

Será, como foi

Foi uma tal mistura de línguas
Quando sonhei contigo

A luz eclodia, nalguma fissura
Sei disso, mais nada

Choraste tão bela, dona da vida
Singela, impávida, sincera, amiga

Amaste-me e eu te amei
Deste-me a mão qu'eu dei

Amaste-me como a um rei
Sentada, nem lúbrica nem
Mortal

Eras o signo de Eva, livre do mal
Tamanha liberdade, não vi igual

Livre e leve foi o amor
Aliviaste teu pranto
Nos ombros dum desconhecido
Pleno transporte público

Leva como presente o agasalho!

Ó, amor liberto!
Jamais podarei tuas asas!

***

Sonho qu'eu tive em 30/04, uma quinta-feira. Fora dormir pouco depois de meu retorno ao lar da faculdade, deitei-me e logo adormeci pouco após as 3h da manhã. O sonho levou um tempo incomensurável - sempre esta, aliás, a magia do sonho. Imerso em seus detalhes e envolto pela totalidade, não pude deixar de amar. Eram 6h e pouco da manhã quando descerrei meus olhos, já com os 4 primeiros versos brancos determinados. Recordar de cada minúcia amorosa, unicamente gestual, que transcorreu - meus olhos procurando os teus, mareados de lágrimas, depois os teus, retendo o meu olhar de forma bela que jamais igualada noutra circunstância "real", "vivida". Refuto tal tese. Eu vivi contigo - sim, breves momentos, mas intensos olhares, correspondência de toques de mão, os afagos reconfortantes no teu braço esquerdo. Rememorar precisamente ofuscaria o brilho da multiplicidade de valores que eu interpretei naqueles momentos mágicos, estendidos, naquele trajeto do ônibus, que alcançou tua destinação no instante exato em que tu recobraste tua consciência e força como mulher. Não, nós homens somos fracos, mas o ato de reconfortar-te valeu-me a força. Tão completo foi o sonho - simples e uno tal qual postulado por Horácio, em sua Arte Poética - que me vi (no próprio sonho) escrevendo em inglês, em memória a ti, num papel envelhecido, amarelado, doutrora: She loved me. Não havia nada de pretensioso nessa exposição concisa - sei que me amaste, sei que te amei (isto não basta? A mim, sim). Daí a veracidade da citação do Ars Poetica. Antes de desfechar meus olhos, escutei um pedido etéreo de desculpas, audível por ninguém mais: Perdão por fazer-te abrir os olhos, estando a luz da cozinha acesa. Perdoei-te ainda antes de abri-los. Verdade: meus pais estavam na cozinha, fazendo sua refeição matutina antes de seguirem para o trabalho. Vazava luz no quarto. Eu acordei. Transcrevi. Te amei.

Nenhum comentário: