terça-feira, 10 de março de 2009

A Excomunhão da Vítima

Foto: Clemílson Campos/ JC Imagem

Miguezim de Princesa*

I
Peço à musa do improviso
Que me dê inspiração,
Ciência e sabedoria, Inteligência e razão,
Peço que Deus que me proteja
Para falar de uma igreja
Que comete aberração.

II
Pelas fogueiras que arderam
No tempo da Inquisição,
Pelas mulheres queimadas
Sem apelo ou compaixão,
Pensava que o Vaticano
Tinha mudado de plano,
Abolido a excomunhão.

III
Mas o bispo Dom José,
Um homem conservador,
Tratou com impiedade
A vítima de um estuprador,
Massacrada e abusada,
Sofrida e violentada,
Sem futuro e sem amor.

IV
Depois que houve o estupro,
A menina engravidou.
Ela só tem nove anos,
A Justiça autorizou
Que a criança abortasse
Antes que a vida brotasse
Um fruto do desamor.

V
O aborto, já previsto
Na nossa legislação,
Teve o apoio declarado
Do ministro Temporão,
Que é médico bom e zeloso,
E mostrou ser corajoso
Ao enfrentar a questão.

VI
Além de excomungar
O ministro Temporão,
Dom José excomungou
Da menina, sem razão,
A mãe, a vó e a tia
E se brincar puniria
Até a quarta geração.

VII
É esquisito que a igreja,
Que tanto prega o perdão,
Resolva excomungar médicos
Que cumpriram sua missão
E num beco sem saída
Livraram uma pobre vida
Do fel da desilusão.

VIII
Mas o mundo está virado
E cheio de desatinos:
Missa virou presepada,
Tem dança até do pepino,
Padre que usa bermuda,
Deixando mulher buchuda
E bolindo com os meninos.

IX
Milhões morrendo de Aids:
É grande a devastação,
Mas a igreja acha bom
Furunfar sem proteção
E o padre prega na missa
Que camisinha na lingüiça
É uma coisa do Cão.

X
E esta quem me contou
Foi Lima do Camarão:
Dom José excomungou
A equipe de plantão,
A família da menina
E o ministro Temporão,
Mas para o estuprador,
Que por certo perdoou,
O arcebispo reservou
A vaga de sacristão.

(*) Poeta popular, Miguezim de Princesa é paraibano e está radicado em Brasília.


***

Psicopatas Fazendo a Festa
(minha versão)

A fera enraivecida tomou o chicote da Inquisição
Brandindo e gemendo, ressuscitou em si o Cão
Observar os estupros cometidos, e vir dar o seu perdão
Ao estuprador, coitado, também um filho de Deus...

Que talvez tenha um cérebro de macaco,
Regulado pelos mecanismos penianos...
Um chimpanzé que idolatra o saco
E aterroriza seus confrades humanos

Mas ainda assim criatura de Deus...

Um ser humano que não se arrepende
Que solto irá estuprar novamente
E não há transa que o contente
Ele curte dominação
Até na cela da prisão

Corre, pega, ele gosta de comer
Se correr o bicho pega
Se ficar o bicho come
E ainda assim humano...

Controlado pelos instintos mais básicos
Remorso: inexistente
Culpa: não sente
Mas ainda assim humano...

Pronto para se ajoelhar e rezar
Antes de sair pra estuprar
O que a sociedade quiser
Ele vai nos encenar

Porque o que deseja de verdade
É estuprar
E se nem a Lei o segura
É o santo padre
Quem o vem ajudar...

Um mundo ignorante e nas trevas
É tudo o que o psicopata mais sonha...
Nos aguarda o futuro, e uma realidade medonha.

8 comentários:

Lucas Pascholatti Carapiá disse...

E já dizia Tom Zé se referindo ao interior da Bahia "Eu nasci na idade média".

"Que talvez tenha um cérebro de macaco,
Regulado pelos mecanismos penianos...
Um chimpanzé que idolatra o saco
E aterroriza seus confrades humanos"

Renato disse...

Que a igreja poupe os cordelistas e sua sublime inquietação enrustida nas palavras musicais que só deles.

Que poupe também os Fernandos poetas e sua complacência.

Lucas Pascholatti Carapiá disse...

"Milhões morrendo de Aids:
É grande a devastação,
Mas a igreja acha bom
Furunfar sem proteção
E o padre prega na missa
Que camisinha na lingüiça
É uma coisa do Cão."

Amei o poema do paraibano!

Me lembra d"O Homem que virou suco"

Lucas Pascholatti Carapiá disse...

Quem porra é esse Renato que comentou ali em cima?

Cara sem noção, desculpa se você o conhece...

Fernando disse...

Lucas, respeitemos a liberdade de expressão - somente um estado autoritário a coíbe. O blogue é livre, gratuito, e, nessa condição, aberto a comentários, sempre.

Um comentário abrange diversas leituras, Lucas, procure não levá-los para o lado pessoal. Não há porque. No comentário do Renato, sim, conhecido meu e do meu irmão, vi duas interpretações possíveis.

Bem, eu acho que nós, no papel de leitores, ao atirarmos pedras, podemos tê-las trazidas de volta aos nossos telhados de vidro. O que é perigoso!

Lucas Pascholatti Carapiá disse...

Me pergunto também, por que as pessoas ligam tanto em serem excomungadas? Se a comunhão é só uma cerimoniosinha, se um dia eu fosse excomungado diria - Foda-se não queria mesmo, algo que nunca fiz.

Eu acho que estas pessoas que foram excomungadas deveriam é ficarem felizes por se livraram de tal instituição maligna e alienadora chamada de igreja católica.

Para que os cordelistas ou os poetas quereriam perdão? Eu não gostaria de perdão nenhum de ninguém e nem da igreja, de qualquer uma delas.

Lucas Pascholatti Carapiá disse...

Posso não concordar com tais opiniões, mas luto pelo direito delas serem ditas.

Mal disse apenas do comentário, sim, posso ter sido meio duro atirando pedras, claro, mas é que sei lá... Você deve me entender, ignorância existe, mas pode existir ironia também, e neste ponto, se fosse esta a interpretação eu agi mal em ter maldito um comentário como este.

Fernando disse...

Policiemo-nos. Como dizem Jesus ter dito: "Não julgueis, e não sereis julgados." Paz = liberdade = mútuo respeito. Fechemos este capítulo, e mais esta lição.