Que livro! Exclamei por dentro ao terminar de ler as poesias finais. Que obra-prima da literatura russa e, por que não, universal! Bóris Pasternák é lírico, poético, fluido. É um autor genial.
A começar pelo enredo. Como já diz a palavra, a estória te envolve, te prende, te enreda e enlaça. E tudo que passa em frente aos seus olhos é tão verídico como a vida que se desenrola no seu dia-a-dia.
No entanto, uma sublime diferença: tempos revolucionários, abordados de forma ao mesmo tempo histórica e romanceada - e isto não vem em detrimento do todo, de forma alguma. O romance em nenhuma parte prejudica a estória. Não transfigura criminalidades e viltezas em virtudes e coisas belas, ou mesmo admiráveis.
É um livro libertador e ampliador de horizontes em principal conseqüencia de não se deixar o autor pregar o que é "certo" ou "errado" ao ledor. Não se diz serem os mencheviques ou os bolcheviques os direitos. Não se proclama, também, serem, ora os Vermelhos ou os Brancos, os corretos nesta história toda. O fato é que ambos se embateram ferozmente, sempre, é claro, para a infelicidade de todos que viviam nesses tempos convolutos.
A miséria, a fome, o frio, tudo é abarcado, de forma comovente, emocionante. É de - sem exageros - se derramar em prantos, em determinados momentos. Comigo foi ao final do livro, nas vinte últimas páginas.
Por que, pergunta-se como se por instinto, há tanta violência dirigida de humanos a humanos? Por que a incompreensão é elevada como um mote, e a destruição como a meta ulterior? Pra quê, exatamente, tudo isto? A nível local, regional, global, o que há de errado nisto tudo? Por que as ditas faculdades intelectuais humanas não nos impedem, todavia, de matarmo-nos uns aos outros de maneira tão atroz e horripilante?
Enfim, não sei se é possível, sinceramente, ler-se tudo o que se almeja ler em uma vida. Nâo serei determinista: talvez sim, quiçá não. Pois bem: este eu li. Arrepender-me de alguma leitura passada? Não me arrependo, pois tudo faz parte da formação do leitor. Mas esta deve ser colocada em seu devido altiplano - sua auréola não deverá ser perdida.
O Doutor Jivago é uma história humana de períodos caóticos na Rússia, a começar por volta de 1905 e findar por meados de 1943. Por mais que seja um extenso decurso de tempo, a aura de perfeição emotiva não larga um momento sequer a trama da história que nos é contada. Cada personagem nos é gravado, tal como o cinzel faz sulcos na madeira, como o cimento que é a base do tijolo. No fim, o leitor se descobre virando as páginas, sem, no entanto, se esquecer da história.
O que se dá no interior dos personagens em tempos de crises econômicas, sublevações sociais e lideranças bestiais? Como são influenciados, até que ponto podem repudiar tal sistema criminoso, ceifador de milhões de vidas, muitas das quais nunca contabilizadas?
São incontáveis as reflexões que o livro suscita, seja em seus profundos e marcantes diálogos, seja no descrever a cenografia, completamente cinematográfica. É tudo, ao mesmo tempo e modo, tão óbvio e - num aparente paradoxo - tão enevoado. As matizes e as tonalidades conferem ao romance um ar de pintura neo-expressionista, ou mesmo realista.
Puxa, que livro.
Há 20 horas
2 comentários:
Alguém pegou gosto pelos russos, pelo visto!
Anotada a sugestão ;D
não tem a haver com o post, mas uma fotografia do seu blog foi citada no Ecce Medicus:http://scienceblogs.com.br/eccemedicus/2009/10/nhem-nhem-nhem_filosofico_1.php
fiquei super contente, vai la ver!
beijão
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