Descontente com o resultado já calculado da primeira bomba (isto é, com a hecatombe de mais de uma centena de milhares de vítimas), os EUA resolveram lançar a segunda bomba, carinhosamente apelidada de "Fat Man", em Nagasaki, no dia 9 de agosto. A cifra de mortos é horripilante. A de feridos e malferidos, de vítimas que viriam a morrer após longas e intermináveis tormentas patológicas, é, também, inimaginável.
Como é belamente expostulado no livro, na fala de uma das vítimas (a quem Masuji Ibuse soube dar voz com tamanha maestria):
Hiroshima é uma cidade queimada, uma cidade de cinzas, uma cidade de morte, uma cidade de destruição, as pilhas de cadáveres são um protesto mudo contra a desumanidade da guerra.
Ou, ainda de outra:
[...]compreendi[...]que a guerra é um assassino sádico dos seres humanos, sejam jovens ou velhos, sejam homens ou mulheres.
E, por fim:
...Sabe, dizem que o novo tipo de bomba que deixaram cair em Hiroshima pode conter a potência de vários milhares de bombas comuns de cinqüenta quilos no espaço de uma caixa de fósforos. Algum químico realmente repulsivo deve ter descoberto isso. Se eles vão sair por aí usando-a para matar pessoas, não sei como as coisas vão ficar.
Eu havia tomado conhecimento deste ilustre escritor japonês, Masuji Ibuse(1898-1993) por meio de um livro com compilação de contos nipônicos, Maravilhas do Conto Japonês (ed.Cultrix, 1962), que tomara emprestado na Biblioteca Municipal Nuto Sant'Anna, primeiro em 2006 e, para releitura, no mês passado. No livro figura um conto seu, A Salamandra (Sanshô Uo), de 1929, portanto, bem anterior à obra que iria torná-lo um escritor consagrado: Chuva Negra foi publicado em 1965.
Poucos são os escritores que têm quase quarenta anos de espaço entre a publicação de uma obra e outra. E poucos, ainda, são capazes de abordar um massacre de forma tão literária e lírica, quase poética, em algumas passagens. A última estrofe é tão profunda, que virtualmente exorta o leitor a reler o livro.
Adiarei por ora esta releitura. É chocante, é marcante. Em partes, sufocante. Assemelha-se, em alguns pontos, a Germinal, de Émile Zola: como já disse minha professora Suely, "falta ar ao leitor". Por instantes, é possível adentrar no espaço-tempo atroz descrito em frente aos nossos olhos, para nunca mais voltarmos os mesmos.
Nesse sentido, Chuva Negra é uma obra grandiloqüente. Fala diretamente à alma.
Sem subterfúgios.
Um comentário:
Fiquei com vontade de ler agora =)
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