segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

A Voz Solitária do Homem (1987)


Comovente, esta poética obra cinematográfica de Alexander Sokúrov, baseada no livro do escritor soviético Andrei Platonov. Assistindo, não pude deixar de pensar que o filme parecia muito mais antigo. Combinando uma trilha sonora de arrepiar os pêlos, com uma fotografia que eu só poderia caracterizar como poética, é uma película que merece ser vista com a mesma atenção que se lê Rilke, ou Carlos Drummond de Andrade, ou qualquer outro grande pensador que fez das palavras mais do que um mero canal de comunicação.

Como julgar se um filme é bom? Certamente quando ele te transporta a outros tempos. A partir desse mágico instante, deixa de ser meramente um apanhado contínuo de imagens, para então compor algo muito mais grandioso e holístico: um retrato integral da vida. Pois não importa que aspecto se aborde, este é um campo infinito. Se bem que A Voz Solitária do Homem pega a vida por seu viés decadente, e nos escancara uma degeneração dos tempos e dos valores.

De seu casamento conflituoso com a mulher que mais o amava, a encantadora Lyuba, podemos perceber que algo não vai bem. O pano de fundo, que a história apresentada na tela não nos conta, é a participação de Nikita na guerra civil soviética, que levou à vitória do Exército Vermelho, criado por Leo Trotsky, posteriormente assassinado em exílio no México. As cicatrizes da alma demoram a fechar, ou mesmo remanescem abertas, como no caso desse protagonista arrasado por suas experiências, que, obviamente, devem ter sido das mais traumáticas.

Sob esse ponto de vista abarcador, o filme se prova um libelo contra a inumanidade da guerra. Pois, não importa que lado vença, os derrotados sempre somos nós. Deste lado ou d'outro, somos os traumatizados, somos os que fracassaram - em solucionar de qualquer outra maneira o que viria a ser um assassínio em massa de seres humanos despojados como peões num vil e reles tabuleiro de xadrez. Portanto, o filme vem a mostrar que somos mais do que isso: somos mais do que braços portadores de armas, braços abundantes que se repõem no calor da batalha.

E é exatamente por não mostrar uma cena sequer da guerra, que o filme pode mostrar sua face mais dolorosa: sem um ferimento no corpo, Nikita há de arcar com todo o sofrimento e a angústia moral por que passou, que entreviu, e que vivenciou. Um homem atormentado pela crua e irrevogável memória torna-se uma alma destroçada. Todos os cacos, de seu ser, espalhados pelo sórdido chão, são virtualmente impossíveis de serem recompostos no espelho íntegro que uma vez o foram. Fragmentos do Real... e de onde virão os homens visionários, se lhes impõem semelhante destruição em tão tenra idade?

Homens envelhecidos, e de fato embrutecidos, por uma guerra que não lhes diz respeito. Não lhes diz respeito, porque tal embate constituí um desvirtuamento das razões de ser do Homem. E quais são elas, estamos nós por descobrir. Mas tal possibilidade nos é extirpada assim que se engendra uma guerra. Não viemos ao mundo, pois, para dele tirar outros que a ele vieram da mesma maneira que nós. De forma alguma fomos gerados por nossos pais com o macabro intuito de banhá-la a sangue e guerra.

Andrei Platonov (nascido em 1899 e falecido em 1951), foi um dos precursores do existencialismo. Jean-Paul Sartre e Camus, apesar das dissensões teóricas que mantiveram em vida, figuram dentre os principais expoentes dessa "corrente literária", ou desse "movimento". O Estrangeiro, um escrito primordial de Albert Camus, invoca uma profunda reflexão sobre o que é, fundalmentalmente, essa corrente de pensamento.

O homem existe, antes sequer de possuir a consciência de ser? Ou possui a consciência de que é, antes mesmo de existir?

Não sei por qual motivo, essa indagação resultou em mim após a leitura de O Estado de Sítio, A Peste e O Estrangeiro, de Camus.

Talvez não haja resposta. Ou, só venha a descobri-la quando já não estiver mais por estas bandas.


Someday, somewhere, we'll all seek... greener pastures.

Will we ever find them?
Will we ever find the answers to our undying inner questions?
Or we'll enmesh ourselves - again - in just another endless pursuit?

Who holds the answers?
Is there such an entity, overlooking our growth, development, later decease and death?


Hoy, Beholder!

Where do we depart to?
Why is our final destination enshrouded in such a mystical mystery?

Which way is the way out...
To freedom?


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