domingo, 20 de abril de 2008

As questões existenciais de um excomungado


[Campos Elíseos - Léon Bakst(1906)]

O triste semblante de uma alma sofredora. O homem acabara de ler a parte V d'O Gurdador de Rebanhos, os poemas idílicos de Alberto Caeiro. Chorou na seguinte parte:

"Mas se Deus é as flores e as árvores / E os montes e sol e o luar, / Então acredito nele, / Então acredito nele a toda hora, / E a minha vida é toda uma oração e uma missa, / E uma comunhão com os olhos e pelos ouvidos."

As lágrimas escorriam por seu rosto vincado pela solidão.... Depois de derramar a derradeira lágrima, o último respingo da tristeza que o assolava, ele compôs o poema abaixo:

Ando pensando muito em Deus,
Se este está nos atos meus
E s'Ele se mostra aos ateus,
Ou será qu'ele 'stá nos atos teus

Mas, talvez,
Ele não esteja nos teus
Nem nos meus
E, quiçá,
Não exista pros ateus
Mas ainda [assim] é Deus

O que é Deus?
Não sei,
Ao passo que não tenho religião para afirmá-lo,
Nem sou ateu para negá-lo,
Ou mesmo agnóstico para questioná-lo

Sou um mero vassalo,
Mas não um joão-ninguém
Pois, no fundo, todo mundo é alguém
Com ou sem um reles vintém

E, a quem busca, um dia a verdade vem. E o ninguém, torna-se alguém. Sussurrou o homem ao final de seu poema: "Amém"... Levantou-se e gritou: "Esta é a minha religião! Minha religião é a minha vida!" E desabou, partindo para os Áureos Campos Elísios, onde sua alma de santo encontrou a paz junto a Hades e aos heróis.
[Plutão/Hades - Agostino Carracci(1557-1602)]
Comentário sobre meu artigo

2 comentários:

Lucas Pascholatti Carapiá disse...

Deus está em nós, mas nós não somos o Deus.

Disse Lao Tsé um vez.

Deus é isso, é tudo, toda a energia, tudo. Se fazemos algo, é em Deus que fazemos. A vida em uma grande missa e comunhão. E acredito, sou ateu para negar este Deus. Loucura, criada pelos homens por sua fraqueza, não creio em além mundos. Mas sou crente o suficiente pra crer nas arvores, nas folhas, nas cachoeiras, nas pessoas, na existência, no sol, em cada estrela. Deus é tudo e nada.

Nada é Deus, tudo é Deus. Deus é Tao e o Uno, o insondável. O nada o infinito o tudo.

Fernando disse...

Muito bom!

É exatamente isso que eu penso. Só me falta senti-lo do âmago da minha alma...

Do pensamento à ação, o homem trilha um longo caminho, mas com o Pascholatti e seus incríveis comentários, já não me encontro sozinho....

:p