quinta-feira, 24 de junho de 2010

Pevides Lançadas Além

Meus entreabertos olhos
Entreolhavam você
Eu entretido em olhá-la
Como quem primeiro vê

E não crê, não pode crer
E suspende o pensamento
Num suspense muito lento
Lentamente a escorrer

Como lágrimas rolando
Dois olhos semi-cerrados
Pingo a pingo gotejando
O timbre teso, calado.

Minha garganta entupida
As narinas ressequidas
Num grito clamando a vida
Perdida, querida, a vida

Quem a levou de repente?
As veias pulsando ainda
Tornado triste o contente
Não quero ir, minha dinda

E vale minha vontade?
Minha íris rebrilhando?
Escuto Sheherazade
E tudo, tudo é tão brando

E tudo, tudo vibrando
Nada é nefando, terrível
O incrível é possível
E o fim vai começando

Ouço as canções de infância
Não há saudade nem ânsia
Apenas vãs cantilenas
Vãs e belas e serenas

Vãs, singelas e pequenas
Como humildes Madalenas
Perfumando Os pés alheios
Sem ofensas, sem rodeio

Irá embora quem veio
Cultivado seu centeio.
Qual tristeza haverá nisso?
E qual maior compromisso...

Nasceu, semeou, brindou
Das alegrias provou
Sem asas alçou seu voo
E voou, voou, voou...

2 comentários:

Evandro Rodrigues Vicente disse...

Fe, não sabia que você escrevia. Estava especulando a vida alheia, pois é para isso que o orkut nasceu rs, encontrei o link deste excelente blog. Obviamente não li todos, mas os que li, me encantou. Espero ler muitos mais. E acho que você deveria divulgar mais este espaço. Não sei se apenas eu que não sabia, mas fica a dica.


Apenas um concero ortográfica na quinta "cobra" de baixo para cima, terceiro verso: "comçando", falta a vogal media-alta anterior não-arredondada rs

Parabéns novamente.
Abração

Fernando disse...

Valeu, Evandro!

Venho nutrindo este projeto há algum tempo. Ele tem especial importância para mim, já que me possibilita seguir uma linha poética com a qual sinto necessidade de contato.

E expressar isso num meio virtual pode mostrar-se iportante para outras pessoas também, o que é ótimo. Ler é incluir-se. Ler e compreender é mágico. Ler faz a vida valer a pena nas piores situações possíveis.

É quando você tem a chance de ver outros iguais a si, mesmo quando o mundo inteiro já parece te rejeitar, numa espécie de paranoia já criada pela própria sociedade caótica em que vivemos.

Ler não é uma válvula de escape, como muitos tendem a pensar. Ou escrever, uma crença em ilusões. Muito pelo contrário, os dois são atividades de compreensão de si mesmo enquanto indivíduo incompleto num mundo que, tido em conjunto, ainda é incompleto, e povoado por pessoas tão distintas entre si que por vezes se tornam irreconhecíveis.

A literatura, como nenhuma outra ferramenta, permite essa aproximação fabulosa. A literatura por si só é fabulosa, mesmo que não possuísse esse dom inato de conectar realidades - e mundos - tão longínquos e, à primeira vista, inacessíveis.

Tudo é possível na literatura. É um universo de possibilidades esperançosas, porque são possibilidades de mudança, transformação, e, ultimamente, transubstanciação. Milagres acontecem. Um livro pode mudar nossa perspectiva do mundo. Ou um poema. Ou um conto. É nesse viés que eu creio na literatura. É um instrumento de mutação de nós mesmos enquanto indivíduos, e não como sociedade. É um sonho possível.