domingo, 18 de abril de 2010

Anuaí


Nasce um pássaro de fogo
Denso silêncio da selva
No principado de Togo
Ensombrecido na névoa

Penas queimadas-carvão
Olhos brancos perolados
Perfuram a negridão
E a tumba do passado

Penetrar a ignorância
As chagas da violência
O destino ao qual se lança
Desd'a virgem mata densa

Crer ainda em homens sãos
Tira suas noites de sono
Um véu se põe entre irmãos
E os lega ao abandono

Como pode alguém ser dono
De alheia alma outra vida
Na alheia terra, o colono
Roga a um Deus fratricida

Ora em sua súplice hipócrita
Nomeia a si ortodoxo
Gera a irmandade inóspita
Engendra o seu paradoxo

Reza a si boas-venturas
Faz do vizinho seu pária
Leva uma vida segura
Entrega o outro à malária

"Demonizar-te eu irei!"
O algoz parece dizer
"Súdito, sou o teu rei!
Curva-te sob o poder!"

Tiranias e massacres
Vê do alto o sóbrio pássaro
Ó, Pandora, não há lacre...
O mundo é o enfermo Lázaro

Haverá hoje um Jesus...
Que o possa ressuscitar?
Sobram mártires na cruz
Negras candeias no altar

Sobram cárceres sem luz
Infames peias no lar
As verdades, quem traduz
Vira oferenda no altar

Falsidades vêm à luz
Quem quererá as olhar...
Mas o pisado alcaçuz
Derrubará o altar

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