segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Sanctum Sanctorum: A Guerra Santa é Cá Dentro


Sanctum Sanctorum: A Guerra Santa é Cá Dentro

Deixa meu sacrário em paz!
Tu não quererás saber,
O que aqui jaz.

Tua curiosidade assaz,
Fá-lo em vão padecer,
Ó ser contumaz!

Não sabes, mesmo, o que faz,
Vá procurar viver,
Criatura pertinaz!

Teu rosto sangüíneo
E olhar perscrutador
Conhecem prazeres,
Ignorando a dor.

Aflige-se, no entanto.
Com matérias triviais,
Coisas vis sem encanto,
Que entoas em fúteis lais!

Que poeta queres ser,
Se morre em ti a vontade
De buscar o conhecer,
A calmaria na tempestade!

Não me diga:
"-É verdade."
Antes prossiga
No culto à inverdade.

Pois as argúcias que empregaste
Irão cobrir-te inteiro com taticumã
Tu não passas, hoje, de reles traste
E não te salvarás ímpio talismã!

Se aind'um dia disseres
"-Minha vida é vã!"
Deixarás de ser um alferes
Impostor, comedor de marrã!

Siga, pois, tua vida
O rubor já te largaste
A vergonha, já esquecida,
Dos inocentes que mataste!

Ó guerra rubra!
Evento Infame!
Qu'a História te cubra.
Não mais sangue derrame!

Rifles e fuzis
Assassinando civis!

Cadáveres chasqueados,
Adunados aos milhares na sarjeta,
As ordens seguidas, atroz matança
Por cruéis soldados fardados
Surde então a Esperança,
Da incólume e alheia greta

De corações humanos
Condenadores de Massacres!

Malferidos sentimentos
Vão tardar a recuperar
Devido aos crimes pardacentos,
Que seus donos foram impelidos a causar!

Novos olhos divisarão novos horizontes
Mas antes volverão aos crimes cometidos
Agônicas faúlhas saltar-lhe-ão aos montes
Para que os torturadores sejam jamais esquecidos!

O zinir das cigarras substituirá, então,
O zunir das violentas, cruentas balas
Os medos humanos enlear-se-ão
E a humanidade terá aprontado suas malas...

Os epígonos de regimes ditatoriais
Serão finalmente condenados
Às penas que lhes cabem
E os desalmados terão voz não mais...
Tendo uma vez sido despertados
Os altos brados dos que sabem!

O martírio cederá seu lúgubre lugar
A ações de homens, desta vez dotados de emoções
Profundas e menos evanescentes:
Entre elas o verdadeiro amar!
E cantar-se-ão belas e inolvidáveis canções!

Feitas por poetas, músicos e ascetas
Todos vestidos de azeviche, em forte luto
Por todos os heróis vitimados pelas setas
Que destruíram o mundo,
Mas não deixaram o ser humano mudo...

Quem viveu nesse período contristador
Sabe mais que nós sobre a perda e a dor
Infligidas em belicosidades sem qualquer valor...

Fulgurantes íris virão iluminar
Os pórticos outrora escancarados
Aos demônios do guerrear,
Tenazes, vilões e mascarados
Os demos que intentaram dominar
Todos os homens, analfabetos ou letrados!

Nesse comenos, o vozear humano gritará:
"-Liberdade dos conflitos, a nós duramente impingidos!"
E o tatalar nas árvores, o ruflar da ave que enfim gorjeará:
"-Luto aos homens e mulheres, e todos os civis falecidos,
Nesta Guerra Mundial!
O homem jura ad aeternum hoje: não mais matará!
As cruezas e os combates desferidos,
Não serão com o tempo esmaecidos,
Porque já não vive mais o homem bestial!
Declaro, por fim, neste momento final:
Terminam hoje as façanhas dos demos do Mal!"

E assim morreram os homens bestiais.
Com o renascimento de conscientes mortais.
Que souberam, finalmente, clamar, em voz alta,
Um sonoro, e inesquecível: Jamais!

Não Sei Que É Deus

Não Sei Que É Deus

N
ão posso dizer Adeus
Amigo, não é possível...
Os passos percalçados são meus...

Se tu me houvesse avisado
Eu de certo estaria preparado
Impassível, eu enfrentaria

Que quer que seja
Uma montanha eu escalaria
Embates, bravo, travaria!

É... por fim, o descanso...

Deixa-me, cá, a estar
Espadelo o linho da minha vida...
Uso estes últimos momentos,
Só para mim... enfim... por fim... ah, sim!

Mom

Mom

Mom,
We talked about everything,
But we never talked about Death...

Now it's too late,
You have met your fate,
And I will soon meet mine
It doesn't matter, at all,
For the sun will continue to shine...

Above our heads,
Physichally or not,
It will keep on burning
Lively, monstruosly hot...
And I will keep on living
On the sunny, hopeful spot...

And belting out, will exclaim: I have got!

What, exactly,
I simply don't know
Anything beyond:
I will reap what I presently sow

I will weep many times
Before I truly and innerly grow
Purer and simpler and truer
As the crystalline, pristine snow

Which by the red, smouldering fire
Beside the churning flames of desire...
Keeps my soul's unquenchable strength and glow

I can't worry at all, if it'll be fast,
If it'll be slow...

I will reap
What
I sow.

domingo, 24 de agosto de 2008

Não Gorjeiam, Não.

Não Gorjeiam, Não.

Quem dera,
Em minha terra, houvesse,
Tudo o que dizem
Lá existir!

Pois inexiste,
E andam tristes,
Os que falam
Sobr'o falso existir.

Pungente sobre o peito,
A mentira.
O despeito;
A ira do devir.

Pode(m)* rosnar, cachorrada,
Pois não é cá que há,
Nem lá quer irá haver!

Chega de inverdades.
Pois já aconteceu:
O que não era,
O que não foi.
E o que não será.

Sim, na minha terra,
Bem-te-vi nu'é sabiá.
Matraca é morta à estilingada,
E ronca-se bem após feijoada...

Caçoa-se à beça,
Nesta terra de bacharéis!
Ri-se às desbandeiradas;
Bebe-se garapa após mis pastéis...

E a saúde anda,
Lado a lado,
À saúva safadona.
Ela pica, a gente grita!
E logo tudo vira zona...

Estuda-se mal para virar o quê?
Talvez mais um estúpido em seriado de tevê...

Chora-se e magoa-se pelo passado,
Que, ilustre, segue desconhecido.
Rouba-se, faz-se lavagem monetária,
Embaixo do nariz, da plebe ordinária...

E cá estamos, eu e você,
Assistindo às olimpíadas na telinha,
Enquanto o gerúndio, analfabeto,
Mata a língua e espezinha.

O que outrora foi bonito,
Hoje não mais é:
Camões, estrangeiro, está morto!
Coelho ganhou renome!
É tão famoso! igual Pelé...

Literatura na escola:
Salvam-se poucos professores,
Letrados e sabidos,
Que sabem ensinar.

Tenho a sorte de ter aulas
Interessantes, neste Brasil,
Onde o vestibulando
Desvia-se, no Rio, de tiros de fuzil...

E em São Paulo, não me diga,
É assaltado saindo do metrô,
Isto quando não é espancada a aluna,
Por nazis que a confundiram, coitados, com prostituta,
Numa Laranja Mecânica viva e retrô!

Viva! às medalhas,
Que eu não conquistei!
Todas as alegrias
Por que, mesquinhas,
Minh'alma derramei...

São de ouro as medalhinhas,
De manteiga o coração,
Felicitamos os atletas:
Cujas verdadeiras metas,
Jamais se saberão...

Porque ignorância, cá nesta pátria,
Já virou sinônimo de erudição...

“Nós”, já não falamos.
É "A gente" a primeira pessoa do plural!
O “Vós”, esquartejamos, em praça pública...
"Tu" se conjuga errado lá pro Corcovado.

A Revolução dos Bichos chega, já, povoado!
O português será, logo, logo, ensinado no curral:
E a feijoada, que alegria! virá salina, salgada,
Bem feitinha pra suarmos,

Pelos poros,
O excedente sal...

Eis minha terra,
Como podes constatar!

Vive-se e morre,
Cedo ou tarde,
E a maioria das crianças desconhece:
O que é, de fato, estudar...

Tal é meu país,
Não veja o tronco, sem ver a raiz,
O Pau-Brasil dá que cor, mesmo?
Me disseram ser anis...

Um viva - a todos os Brasis!

Terras, onde o infeliz
Auto-afirma-se feliz;
Onde Pinóquios
Abundam!
Viva o nariz!

Mentirada danada,
Êe... Saúva safada!

Ah, que terra estudada,
Venha cá me visitar!
Cuidado! na esquina,
Que a exclusão social vai te pegar!

Gripe, aqui, é fichinha,
Febre amarela é para os fracos...
Contagiosa mesmo é a malandragem inata!

Pega ele, Macunaíma!

Que esse daí é gringo!

[gargalhadas histriônicas no fim da declamação]

* plural optativo


P.S.: Segundo minha - hoje - ex-professora e também escritora, Carla Souto, autora do recente livro Nelson Rodrigues - O Inferno de Todos Nós (1ª edição: 2007), não é de seu costume escrever "ótimo" em trabalhos. Bem, talvez ela ainda não saiba quão feliz voltei para casa após aquela aula em que recebi o trabalho. Da qual, aliás, lembro-me nitidamente bem, em seus detalhes. Às vezes um comentário inesperado de outrem pode dar uma guinada radical no seu dia. Carla, já sinto enorme falta de suas inspiradoras aulas. E sobretudo meus parabéns: são muito poucos os professores que conseguem fazer um aluno feliz por um dia sequer. Sua última aula sobre o Nelson Rodrigues foi de arrepiar. Inesquecível. E, claro, só li Amar, Verbo Intransitivo, do Mário de Andrade, porque você fez questão de passar o lindo filme para nós, em sala de aula. Provou-se uma esplêndida leitura, e foi também um ótimo filme, bastante fiel à obra que o engendrou. Você merece, professora, os agradecimentos deste seu aluno que conquistou o 1º lugar em Prosa no Concurso de Literatura do CEFET-SP deste ano, com Werther, A Epopéia do Amar. Lembro-me de ter saído de uma de suas aulas e comentado com um amigo: aprendi mais de geografia com a Carla, do que com os próprios professores que deveriam nos ensinar essa matéria... Golpe de 64. O ditador que adorava cavalos, e exterminava humanos. Made in Brazil. É, me lembro. Como se tivesse sido ontem. Você merece, ao menos esta pequena e modesta referência, sob esta memorável foto. É só. E é tudo. Simultaneamente.

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Uma Pessoa de Lisboa

Uma Pessoa de Lisboa

Lisboeta foi poeta.
Nunca soube foi amar.
Que triste dura vida,
Sem um amor pra conquistar...


Vida comprida.
Vida cumprida.
Vida sofrida...

(foto: Jefferson Pimenta - clique sobre ela para vê-la no tamanho real)

Poeta da Desilusão

Poeta da Desilusão

Eu sou,
Tu és,
Ele é.

Não sou!
Não és.
Não é!

É tudo mentira...
Como afirmar que sou,
Se mudo dia-a-dia?
Se o "eu" que odeia já amou...

Se o qu'eu outrora disse
Agora, já esqueci.
E aquele que tu viste,
Não mais se encontra aqui...

A promessa se foi.
E o sonho também
...
Já não mais importa, Cloe,
Quem é quem.

Não há ninguém, cá, pra ouvi-la.
Pois tudo ressoa.
Em vão.

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

"O Que Traduz em Verso o Sentimento do Belo"

"O Que Traduz em Verso o Sentimento do Belo"

Um poeta deve, sobretudo,
Conhecer a própria vida.
Seja esta a minha meta:

A poesia cumprida.


A vida poética
Não é vida bonita,
É vida vivida.

Não é ser um sonhador
Mas um ser observador...

A vida observada,
Transformada em poesia:

Do belo ou do feio
Sem revelar o anseio
Poético,
Singelo...

Austero.
Sem esmero.

Viver sem procurar ser feliz
Nem perguntar se é triste...

A vida, desta forma,
Não perderá sua beleza:

Encantadora
Desmistificadora

Sem ilusões.
Idealizações.

Viva!

Humanidade Revisitada

Humanidade Revisitada

Silêncio,
Tétrico,
Num dia de Sol.

O arrebol,
Fenecendo;
E eu,
Quieto,
Irrequieto,
Cogitando,
No atol.

De esperanças,
Relembranças,
(In)Decisões
Que não tomei,
Pessoas
Que não amei,
Porque nunca as compreendi.

Bem sei
Que anedotas,
Como esta,
Não lhes interessarão.

Pois apenas são
Estórias,
Mal-contadas,
Vã recordação...

Os fatos que elas contam
Não merecem atenção.

São sucessões,
Transcorridas,
Alheias à realidade,
Estranhas à ficção.

Pessoas mal-amadas,
Em vão me julgarão.
Não sou mais
Que passagens rabiscadas
Daquele roto,
Ignoto manuscrito,
Atirado ao chão.

Linhas tortuosas
Daquele livro lá no canto:
Puído, carcomido, ignorado
À sombra, estremecente,
Tremeluzente,
De árvores nodosas
Que cobrem, tal o manto,
A fugaz memória
De um sonho inconquistado!

Que livro é este,
Senão a vida?

Que linhas são estas,
Senão os próprios fatos,
Viventes, mortuários,
Que, gradualmente,
A nós encobrirão?

As trincheiras
Do desconhecido,
Registradas
No manuscrito:
Inscritas, gravadas,
Sulcadas:
Esculpidas
No âmago humano,
Nos recônditos
De sua alma,
No pulsar
De seu coração!
...

As passagens recordadas
São evidências retomadas
De uma vida que,
Memorada,
Não foi vivida em vão!

Justaposição <--> Transição

Justaposição...
...Transição

O sufoco,
Rouco,
Emudecido.

O louco,
Mouco,
Ensandecido.

Murmúrio,
Soco...
Coração partido.

Aspectos
Soltos,
D'um mundo cindido:

Facetas
Mil,
Deste ilustre desconhecido.

Seu nome é Terra,
Prazer.

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Grande↑

Fabiano apanhara os picuás que precisava para matar rês qualquer. O aió de fumo no fim, o canudo do cachimbo sarrento, todos esses elementos fazendo de Fabiano um animal atilado.

Cambaio, em frente xiquexiques, mandacarus, quipás, catingueiras, baraúnas, sucupiras, imburanas, todo o universo de Fabiano abria-se e fechava-se ali.

Tomara que hoje não precise de pabulagem, rosnava. A reiúna que lhe pezunhara o pé machucava-o. Por dentro. O dunga da cidade ia se ver com ele da próxima vez. Não é porque sou cabra que tenho de ser preso como um banzeiro! espaçozinho onde mal cabe marrã, hã!

E o magote de plantas secas, espremidas, transforma-se de repente em uma porção de suçuaranas, gostosas de comer. Tão logo surge, desfaz-se. Fabiano capiongo, Fabiano cabisbaixo.

Voltar para casa de mãos abanando ia ser uma briga de chateação com Sinhá Vitória. A panela de losna, velha, fervendo à espera da caça. Sinhá Vitória ia ficar desapontada, o corrião de couro ia fazer as crianças chorar. E o céu sem cirros; mais desgraças por vir, o solo escanchado, sedento, o chape chape da percata¹, tudo isso deixando o cabra forte macambúzio.

¹percata= forma verbal de alpercata ou alpargata, (minidicionário Caldas Aulete:) 'sandália baixa, presa ao pé por tiras de pano ou de couro'. Percata é termo comumente falado no N.E. de MG, na zona rural. Assim como corrião, denominação em uso tanto em MG como BA, para cinto (dicionário Houaiss: 'cinto largo de couro com fivela').

Ser Tão

Sombrio, hum. Vitória o chamava de sombrio. E o que ela lá quer com isso? As costelas à mostra de Baleia assaltando seu já seco sono e aumentando as interjeições guturais emitidas no lugar de palavras. A espingarda de pederneira, dependurada em um canto qualquer, excomungada. Fora mesmo caçar com terçador. O terçador: o terço da esperança, somado à dor - da fome, da seca, da sede, do sertão.

Do ser, tão seco, tão...desalmado.

Veredas

Sinhá Vitória, à margem do fogão, via esses percalços de pé no chão. Tão logo nasce e morre no sertão. Vida moça, vida nova, dura muito não. Nasce filho com borra¹, mas não passa de lubrina² fina, começa rápido, logo termina. Caipira, curupira, nós não é nada disso não. Gente na cidade, bicho no sertão. Aqui não vive gente não. Sertão é viver na tapera sozinho, com medo, só na solidão.

Só.

Solidão.

Sertão...

¹com borra= em grande quantidade
²lubrina= garoa
(expressões em uso no N.E. de MG)

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

Buscai! (Ciclo II)

(|| Leia antes: Ciclo I ||)

A dor que assola,
Amola,
E não consola.

O homem que vive,
Sobrevive,
E chora.

A mão que toca,
Sente,
Mas não vê.

O ouvido que,
Mudo, surdo
E inerte,
Ainda escuta: "Sê!"

A verdade que fere,
A mentira que corrompe,
A dualidade que rompe (com)
Puerilidades absolutistas...

A tristeza que não se faz presente,
Nem, pelo contrário, ausente;
Que os olhos não presentem,
Mas a alma - sobretudo - sente!

E ruge o leão,
As feras ignominiosas,
Verdades escandalosas,
Que, por magia própria,
Erguem-nos, ferozes, do vil e reles chão...

O braço erguido,
O brado ouvido,
O constante olvido,
Do sonho esmaecido...

Esquecido, olvidado,
O sonho nunca outrora conquistado.
Premente, no teu ser,
A vontade de crescer,
Extrapolar...
O ímpeto de viver!

Esquece-se, no entanto,
Que viver é sofrer...
E sofrer é viver.

E tu não compreendes
Como isto pode ser:
Que o homem só fica em pé
Após bravamente se reerguer...
Antes disso,
Nada pode o homem ser.
Não! ao menos não antes de sofrer!

Para, novamente, aprender
Como, enfim, se reerguer...


...

Quem dera teorias
Pudessem expressar
Todas as cruezas
Que temos, por nós mesmos,
De experienciar!
De ver,
Ouvir,
Auscultar,
Degustar,
Inspirar...

Esses mórbidos odores,
Que a alma humana
terá de suportar...

São todos eles meios
Pelos quais
Nossas saídas
Iremos encontrar...

Tateia-se pelo túnel escuro,
Ao som de risos cavos,
Aterradores, inumanos...
Entrevendo-se uma fresta
Atiramo-nos nela em vão...
Era somente uma miragem,
O vestígio de passada ilusão!

Ouve-se murmúrio humano,
Quase inaudível, indistingüível...
E já nos cria esperança
De um futuro auspicioso,
Porque melhor,
Embora austero...

É um futuro inperscrutável...

Renascem as dúvidas,
Nossas questões existenciais...

E o filho vai, pouco a pouco, se libertando
Para, logo ou não,
Descobrir que passou a vida,
Nada diferente de seus próprios pais...

Crendo que se libertou,
Em promessas levianas,
Que o enganaram,
E o deixaram louco, um mero doidivanas...

Crendo no absoluto irreal:
Que ele é homem,
E, ainda assim, imortal...

Grita o homem lunático: "Sou!"
Mas não és.
Se tu fosses,
Não gritarias,
Nem pensarias.
No teu imo,
certamente saberias...

Sem precisar te convenceres,
Por tantas hipocrisias
Que, desmascaradas,
Revelar-te-ão:
Todas as mil porcarias
Que acreditou!
Debalde,
Em vão!

Muçulmano, judeu, ateu, ou cristão,
Sejas tu de qualquer religião...
Tu abriste a porta,
Mas não enxergaste o portão:
Escancaraste a janela,
Para prender a própria mão.

E gritando,
Afirmar que ama,
E buscar, na montanha,
O Sermão.

Que nada te diz:
Porque não conheces,
E sempre te esqueces
Que acreditar
É trancafiar-se,
Indefinidamente,
Na hiante escuridão...

De sonhos,
Devaneios,
Desejos
E anseios.

Que nada condizem com
A Vontade,
Que nunca criaste
Em Si.

A mentira em que creste
Te levaste à pior morte existente:
À auto-depreciação:
O procurar alguém
Para dissipar a solidão;
O admirar as nuvens
Afundando-se na terra...

Errai, errai e aprendei!
Cuspai no pateticamente imodesto
"só sei que nada sei"
Pergunta-te, Honesto,
"Quem sou eu?"

E descubra!

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Cúpula da Vida

"Ai, ai, ai, que céu redondo
Este céu estrelado..."
(Gárdonyi Géza[1863-1922], escritor húngaro)

...
..
.

Se algum momento de minha vida não foi em vão,
Eu não sei afirmá-lo;
Pois vivo estou e não penso em respirar.
E se algum momento valeu mais do que qualquer outro,
Isto quer dizer que só vivi alguns momentos.
O resto?
...
(O resto) Foi desperdiçado em vãos pensamentos.
.
..
...

Ai, s'eu pudesse resumir todas minha lágrimas em uma palavra, esta seria uma só, pois toda minha vida só valeu por ela: aprender. Mas para aprender eu sofro, eu choro e grito de raiva. Porque aprender dói, machuca e penetra meu âmago como uma navalha. E, ainda assim, não desisto de aprender. Não aprendendo, mais vale perecer.
.
..
...

Se eu amasse
Com a mesma intensidade
De minhas palavras,
Eu saberia o que é amar...

Isto somente mostra
Que acreditar em minhas palavras,
É perder-me: não mais voltar.

Isto revela
Que não sou o que digo,
Nem um poeta por escrever poesias.

Sou o que faço,
Mas o que faço?
Além de divagar e enrolar,
Pouco faço, mesmo nada;

Nada digno de se mencionar.
.
..
...

Volta e meia me arrependo
Do que fiz e deixei de fazer.
Mas à medida que vou aprendendo,
Vou deixando de lado o arrepender.

Se o amor fosse tão alcançável como o pintam,
Dele não se precisaria falar,
Nem mesmo enaltecê-lo...

Se fosse realmente fácil amar,
Haveria, pois, milhões de poesias a descrevê-lo?
...

Ah! Se amar de fato fosse
Tão simples como o acariciar dos cabelos...

Ninguém precisaria, nunca, sequer sonhar
Com o que se suspeita ser o amar...
.
..
...

Quero um amor
Quero uma amora
Quero um amor
Uma amora
Um amor
Namora,
Amora
Amor
Dor

...
..
.

Poesia Iugoslava Contemporânea

Citarei dois trechos importantíssimos na minha formação de aspirante a poeta. Não me considero um, embora faça poemetas simplicíssimos volta e meia. O livro é da editora Meca, 1987(São Paulo). O título é o mesmo que dei a este artigo. Prefácio, tradução e notas de Aleksandar Jovanovic.

MAR

"dorme
duas tardias borboletas apressam-se rumo ao sol traiçoeiro
e com a vinda da noite desaparecerão
e duas belezas com elas também"
(autor: Duchán Mátitch[1898-1979])

POEMA DA GRAMA

"Estou deitado no alto gramado e penso indeterminadamente.
Uma formiga sobre meu joelho, como o homem sobre o monte.
Inquieta, a formiga está parada. Eu me calo. E esse é meu poema.
Completamente pensativo, estou deitado no gramado. Os fios de grama silvam pesadamente como pedra."
(autor: Stevan Raftchkovitch)

Submergindo em Nietzsche

Ao ler Zaratustra, percebo quantas vezes deixo de fazer o que realmente penso que deveria fazer, quanto tempo passa a esmo, sem uma atitude pró-ativa referente ao meu futuro. Por que eu me preocupo tanto em machucar ou não os outros, quando, na verdade, eu poderia agir buscando minhas metas? Minhas decisões dizem respeito ao meu futuro, não ao de ninguém em particular que me circunda. São minhas. Eu quero sentir o que estou fazendo e exclamar: São minhas! Só então serei eu mesmo. Só assim. Só aí.

(P.S.: manuscrito meu encontrado em meio a pilhas de papéis, datado de janeiro, provavelmente deste ano [2008])

terça-feira, 5 de agosto de 2008

Life, Death and the Mystery of It All

Have you ever ogles a woman so badly that you instantly felt your gaze was so off-putting as to embarass her deeply? If no, caveat reader, then you are less mortal than your surrounding comrades here on Earth.

What makes us feel so guilty, what is it that really affect our way of perceiving what we do unto others? If we analysed all our so-called mistakes and glitches, would we do any better the next time we were faced with the dilemmas of life? If we had all the knowledge necessary to remain upright in most situations of life, would that encourage others to search for all this knowldedge as well?

So far, with this plentiful of questions raised, I can't provide you with all the answers I should like to. However, I can tell you that living simple, that is, trying to remember you are a mere mortal in this conflictuous world, may really give you an insight into the hidden facets of your life.

What is it that keeps some men on good paths while many idulge helplessly an are lead astray? Mulling over life, death and the permeating and unavoidable reality of it all can be utterly mind-boggling.

Having asked som many questions and not having aswered any of them, I feel inclined to tell a little about 'me'self. As far as it may interest your insatiable curiosity, I am now 17 years old. Being a pubescent myself and not living in a state of hermitage, I have some grasp of what the world is about (or have I?).

Firstly, I have seen so many beautiful women, a sufficient number to please the eyes of all varieties of hot-blooded men. I've also been enamoured, but, incredibly for many, dismissed it all as a jolly silly child's thinking pattern. I don not have a job, but wot endlessly with the aim of filling the disturbing gaps of knowledge I see in myself.

If I have ever thought about death? Thinking about it now, not much, really, 'cause I am alive and hale and hearty for the moment. On second thoughts, I have already felt it passing by an inch when I was almost run over by cars, buses, motorcicles and vehicles alike. Those were really eye-openers, but, as with everything else in life, they tend to fall gradually in oblivion.

Practising the 'I am a mortal and will be dead the next moment' motto rendered me some breathtaking, attentful episodes, which made me do things I wouldn't have done otherwise.

Recognising the little that I know about the encompassing subject of study named life, I really feel I ought to take a breather to ponder on it properly...

...

Well, let's face it. We will all be dead one day, somehow, in a manner and date the huge majority of us simply can't predict, for the better or the worse. The benefit of taking this statement seriously is that it brings a most desirable question (instead of a misdirecting riposte): What would be my last action? What would I wish to be doing in the moment before Death clasped its hands and I parted from this beloved, though flawed, world?

I would light up!

(on the original manuscript: "written on the night before the CPE examination. May God bless me :-)" [this emoticon written by pencil, right below the text])

P.S.: What's God, anyway? Am I a blasphemer to raise this question, which lurks unnoticed deeply inside sanctimonious believers themselves?

Motes e reflexões (atualizado em 18/08)

Alguns motivos concatenados ao longo dos dias, pelos ôbibus e vagões de metrô, no serviço e na escola, deste ano ou de anos atrás. Alguns encontrei em anotações dispersas de 2006, uau.

"The puny pony
Rising its head
Was so beautiful!
oh! my lad..."

"The trough
On the farm
Was so rough...
Had no charm."

"Just an ordinary man. This, I surely am."

"Não existe certo ou errado. Existem, sim, infinitas, ou antes, incontáveis nuâncias entre o preto e o branco, entre o branco e o preto. Como seria possível pensar em (termos) absolutos sem (previamente) levar em conta as matizes e tonalidades que os separam, que os distingüem, e que, portanto, os definem?"

"A terra que piso já foi mil vezes antes palmilhada por outros homens. Entretanto, os passos agora são meus. E isso faz toda a diferença."

"A meditação torna a dor suportável."

"Pouco sei do verdadeiro... se o que sinto é real, se meus olhos não me traem, como saberia? Não tomarei como certo o que de fato não sei.."

"Aprendi que - para aprender - é preciso, inevitavelmente, sofrer. E o que é sofrer? Fazer tudo aquilo que não nos dá na telha: eis o que é sofrer."

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

Mudança de paradigma(s)

Olá, caro visitante. Dir-te-ei algo de total importância, você conhecendo-me ou não. Não faço idéia do que sou, de verdade. Se meu amor é algo passageiro ou não (digamos que por enquanto ele está durando), se a garota quem amo sente o mesmo ou não, se a Aeronáutica irá detestavelmente me designar no dia 12/01/2009 ou não.... enfim: vivo na incerteza do dia-a-dia.

Faço, entretanto, coisitas poucas que me apetecem, ao longo das horas em que me encontro acordado. Leio, por exemplo, Nicolai Gógol em qualquer transporte público. No momento, isto é. Estou, correntemente, a ler Cidade do Sossego, para depois ler O Capote (o livro da biblioteca cá perto de casa tem essa maravilhosa tradução lusitana, cheio de 'c's mudos e "sumptuosidades", hehe...).

Pois, então, também estou trabalhando seis dias por semana. Lá na Oca, caso tu não tenhas lido um dos artigos anteriores deste blog, nomeado Bossa na Oca. É isso, basicamente, o que faço. Fui para Pirituba hoje, ao quartel. Saí de casa às 5h42 e cheguei lá às 6h05. Mesmo assim só fui liberado às 12h15, e de volta soma-se mais uma hora. A ida foi rápida, considerando que minha mãe me levou de carro.

Em casa, agora, escrevo nos escassos momentos livres, porque às 16h, aproximadamente, estarei seguindo para o trampo, e chegarei em casa somente oito horas depois. Se tiver sorte, claro. Já amanhã acordo às 6h e rumo à escola. À escola que me acolheu em 2006, e da qual é-me impossível agora sair sem soltar alguns altos brados de alegria, haha. Tu não achaste que eu iria dizer "sem derramar algumas lágrimas", certo?

Caso tu não tenhas percebido, a nossa mais forte ingratidão vem em resposta a circunstâncias e pessoas nesta vida que nos apontaram uma forma diferente de enxergar tudo aquilo que nos circunda. Ou seja, pessoas e ocasiões que fizeram de nós não ladrões, mas melhores e mais argutos observadores. Situações e indivíduos que nos deixaram mais alertas, mais sagazes, menos ingênuos. Que, não raro, até mesmo tenham aberto nossos horizontes. Resumindo: pessoas e circunstâncias que nos ajudaram...

E a Federal foi (ham, ham: e [ainda] é) uma dessas grandes coisas que nos ocorrem e nos balouçam e nos chocam, e nos enraivecem e nos chacoalham. Mas, no fim, notamos que a vida não seria a mesma se este e aquele obstáculos não tivessem se entreposto entre nós e nossas metas . Porque, afinal, é superando-os que criamos, ou mesmo entrevemos, novas possibilidades em nossas breves vidas.

Como, por exemplo, o meu técnico. Nunca poderia ter imaginado que fosse abrir tantas portas e janelas nesta casinha que eu julgava ser particularmente tão exígua. Consegui um trabalho graças a ele, e conheci a maravilhosa amiga do meu amigo (do técnico), que se tornou, digamos, mais do que uma amiga. E fui escolhido, junto com uma pessoa que se tornou uma valiosa amiga, para apresentar o TCC da sala. E adquiri, finalmente, a sonhada auto-confiança em apresentações orais! O curioso é como tudo aquilo que nos provoca um grande bem acaba sempre vindo embalado em embrulhos tão árduos e penosos de se desvencilharem daquilo que eles contêm (ou assim o foi para mim), que chego a desacreditar-me ao ver tudo que obtive em poucos anos... nada que me compre o antídoto contra as toneladas de terra que me cobrirão em qualquer dia que eu venha a morrer, admitamos.

Mas em poucos anos eu descobri a alegria, sim, a alegria de viver. De colocar a cara ao mundo, e receber os devidos tapas. Nada que me infle de orgulho, porque tapas dóem e, freqüentemente, machucam, demorando para cicatrizar. Mas essas cicatrizes são sinais de lições aprendidas. Tudo tem seu tempo... que frase sábia. E não é assim com a vida? Eu tive o tempo de minha infância, agora nascem primos meus e eles estão vivenciando essa indispensável fase da vida... e cada coisa em seu lugar, e cada macaco em seu galho.

E, em todo esse tempo, eu aprendi uma lição especialmente dolorosa. Aprendi a não-amabilidade, quer dizer, o não sorrir ao receber um tapa na cara, um pisão no dedão, um soco no estômago - metaforicamente falando, óbvio. Aprendi a me abrir - com quem merece. Esta última foi uma das mais doridas lições, com certeza. Aprendi que para amar alguém não é preciso dizer "eu te amo". Ao contrário, as pessoas quem eu mais amei nesta vida, muitas das quais remanescem nesse patamar, nunca ouviram nem provavelmente escutarão tais palavras de mim. São palavras que me pesam demais, e simplesmente recusam-se a sair. Mas, por ações, o amor fica mais belo. Por meio de gestos, ele perde a efemeridade verbal... basta escolher entre os pólos antagônicos: "verborragiar" ou agir, em nome do amor? Eu escolhi agir.

Aprendi, portanto, que um gesto de amor vale mais do que mil palavras.

E tu, o que aprendeste? Comenta, anda.

sábado, 2 de agosto de 2008

Texto Curatorial

O breve texto a seguir foi construído buscando apresentar, de forma sucinta, a proposta do Museu Virtual Carandiru. Aborda também sua relevância na preservação desse patrimônio que nos foi legado.

TEXTO CURATORIAL

Prisão. Penitenciária. Presídio. Cadeia. Xadrez. Casa de Detenção. Tantos nomes para denominar uma realidade freqüentemente ignorada. Só conhece quem lá dentro está.

O Museu Virtual Carandiru lança esse empreendimento, resgatando o significado dos valiosos resqüícios que sobraram daquele que, em seus tempos "áureos", foi considerado o maior centro penitenciário da América Latina.

Há, por exemplo, o muro de 10 metros de altura sobre o qual pode-se caminhar, no Parque da Juventude. É lá também que se encontram as ruínas do Carandiru II, extensão do presídio nunca concretizada. Na Escola Técnica Parque da Juventude é possível visitar três celas recriadas a partir das originais, com portas autênticas, nas quais identificam-se inscrições e pinturas. São Jorge e o Dragão, Salmo de Davi, um grande olho aberto: imagens e palavras que fomentam reflexões, debates, reconceitualização. Sobre o forro de três salas, foram descobertas três pinturas: uma bandeira da Inglaterra, a outra dos Estados Unidos da América, e, por fim, um adesivo de cunho artístico retratando um joão-de-barro.

Tais são os achados. Poucos, numericamente, mas grandes por sua própria natureza. Preservar o passado histórico-social para o presente é resguardá-lo para as próximas gerações.

Depoimento

Elaborei o texto abaixo para compor o TCC do técnico de museu. É, no entanto, somente uma das várias partes que o constituem.

DEPOIMENTO

Ao caminhar sobre o muro que sobrou do Centro de Detenção Carandiru, em um dia frio, não senti nada em particular. Após pensar em escrever este depoimento, no entanto, tentei me colocar na posição dos guardas do presídio, realizando a escolta diária, vendo tudo que ocorria no pátio de cima, como que distanciado da realidade dos presos.

Sobre encontrar-me dentro de uma cela, uma só palavra poderia descrever prolixamente a experiência: medo. Medo de estar trancafiado em um cubículo, com meus movimentos restritos e ao lado de estranhos. O que seria olhar pela janela vendo as pessoas indo e vindo livremente no “mundo externo” estando eu fechado dentro de quatro paredes e um teto, opressivos, cerceantes, vigilantes, onipresentes...

O olho. Um grande olho eternamente aberto, fixo em mim. Temerário, amedrontador. São Jorge e o Dragão: o bravo cavaleiro lutando contra um inimigo formidável, soltando labaredas pavorosas. Com apenas uma lança e muita coragem, ele o enfrenta valente. Se não está tão destemido como parece, ao menos o aparenta – e ao enfrentar um inimigo, nomeadamente a prisão, é realmente isso que importa. O Salmo de Davi: esperançoso, religioso. Quem o escreveu sabia que, ali dentro, quando tudo parecesse perdido e o inimigo, imbatível, somente o salmo poderia trazer-lhe o reconforto exigido para peitar bravamente o embate.